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segunda-feira, 7 de março de 2022

"Fresh": a estreia subversiva, surpreendente e relevante de Mimi Cave e Lauryn Kahn (Bilíngue)

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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para trazer para vocês a resenha de um dos lançamentos mais recentes no catálogo original do Star+, um dos serviços de streaming mais recentemente lançados no Brasil! Contando com um roteiro inteligente, subversivo e metafórico, uma química explosiva entre seus dois protagonistas e aspectos técnicos que essencialmente ajudam a reforçar a mensagem que a narrativa deseja passar, o filme em questão é uma estreia excelente para a sua realizadora, que mostra ter um talento extremamente promissor para o gênero em que o filme é inserido. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “Fresh”. Vamos lá!

(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to bring to you the review of one of the most recent releases on Hulu's original catalog! Relying on a smart, subversive and metaphorical screenplay, an explosive amount of chemistry between its two lead performers and technical aspects that essentially help reinforce the message the narrative is trying to convey, the film I'm about to review is an excellent debut for its filmmaker, who displays here an extremely promising knack for the genre in which the film finds itself in. So, without further ado, let's talk about “Fresh”. Let's go!)



O filme acompanha Noa (Daisy Edgar-Jones), uma jovem frequentemente frustrada com aplicativos de namoro, que, após um encontro particularmente desastroso, decide desistir de namorar por um tempo. Certo dia, ela conhece o carismático Steve (Sebastian Stan) no supermercado, e, abandonando sua decisão anterior, decide se arriscar e dar seu número de telefone para ele. Após o primeiro encontro, Noa se apaixona por Steve e ele a convida para uma viagem romântica no fim de semana, mas o que prometia ser um momento à sós acaba virando um verdadeiro pesadelo.

(The film follows Noa (Daisy Edgar-Jones), a young woman who's frequently frustrated with dating apps, who, after a particularly disastrous date, decides to give up dating for a while. One day, she meets the charismatic Steve (Sebastian Stan) in the supermarket, and, abandoning her previous decision, she decides to take a chance and give him her phone number. After their first date, Noa falls in love with Steve and he invites her to go on a romantic getaway over the weekend, but what promised to be a moment alone between them ends up becoming a real nightmare.)



Haviam duas razões em particular para que eu estivesse com muita curiosidade para conferir “Fresh”: a primeira delas seria que o filme foi considerado um dos destaques da edição deste ano do Festival de Sundance, cenário perfeito para novos talentos surgirem atrás das câmeras e, talvez, até serem reconhecidos nas temporadas de premiações (como foi o caso de “No Ritmo do Coração”, “Summer of Soul” e “Flee”, que foram premiados em Sundance ano passado e receberam indicações ao Oscar 2022); e a segunda seria a campanha de marketing extremamente inteligente elaborada pela Hulu para promover o filme. A distribuidora conseguiu, com o material promocional, instigar e despertar a curiosidade do espectador sem entregar absolutamente nada que comprometa o desenrolar da trama, o que eu achei sensacional.

Não posso dizer que minhas expectativas estavam altas para assistir ao filme, pois além das razões citadas e da presença do Sebastian Stan (mais conhecido pelos fãs da Marvel como Bucky Barnes/Soldado Invernal) no elenco, não havia mais nada para que eu fundamentasse expectativas consolidadas. É o primeiro filme da diretora Mimi Cave, assim como um dos primeiros trabalhos da roteirista Lauryn Kahn, então eu era completamente incapaz de basear minhas expectativas em algo anterior que a equipe criativa fez parte. Fui assistir “Fresh” quase que completamente às cegas, e certamente não há dúvidas que essa é a melhor maneira de experienciar a estreia de Cave na direção. O filme me impressionou de tal maneira, que eu vou fazer dessa resenha a mais breve possível, para que o fator surpresa não se perca para vocês.

Então, vamos falar do roteiro. Seria bem difícil comparar a narrativa elaborada por Kahn com qualquer outra sem dar nenhum spoiler, mas vou tentar o meu melhor. “Fresh” seria uma mistura muito bem homogênea da subversão dos estereótipos do terror e da abordagem simbólica presentes no espetacular “Corra!”, de Jordan Peele, com as temáticas presentes em filmes como “Bela Vingança” (vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Original) e “Okja”, co-produção internacional da Netflix dirigida por Bong Joon-ho, diretor do fantástico “Parasita”. E, como a cereja no bolo, a tensão presente no enervante “Fragmentado”, de M. Night Shyamalan, é replicada de forma perfeita e realista aqui.

Primeiramente, gostaria de destacar o fator de entretenimento contido no roteiro de Kahn. Mesmo antes do filme engatar, de fato, pelas mesmas vias de “Corra!” e “Fragmentado”, o espectador se vê completamente investido na trajetória da protagonista, interpretada pela Daisy Edgar-Jones. A frustração dela, misturada com o desejo que ela tem de finalmente se conectar a alguém, é estabelecida de forma perfeita nos primeiros minutos do filme. Essa mistura de sentimentos é uma das principais ferramentas que Kahn usa para fazer o espectador se importar com o arco narrativo dela e, principalmente, com o relacionamento entre os personagens de Edgar-Jones e Sebastian Stan. Esse artifício me fez lembrar muito de “O Diário de Bridget Jones” e de outras comédias românticas por alguma maneira, o que é engraçado, porque os primeiros 30 minutos não são NADA parecidos com o restante das quase 2 horas de duração.

E com isso, vamos para o segundo destaque do roteiro de Kahn, que é a capacidade de subverter vertiginosamente as expectativas do espectador. É algo realmente incrível. Só pra exemplificar o quanto o filme muda de tom (e o quão bem que Cave e Kahn conseguem mudá-lo sem parecer brusco), sabem quando, bem na metade de “Parasita”, o roteiro vencedor do Oscar de Bong Joon-ho consegue deixar de ser uma comédia de humor negro e passar a ser um suspense de alta tensão? Basicamente a mesma coisa acontece aqui, na marca dos 30 minutos. É muito bom (e original) ver como Kahn lida com dois gêneros que são completamente diferentes, em termos de tom, e como ela escreve os dois de forma honesta, surpreendente, realista e desconfortante. Essa subversão de expectativas e gêneros é, sem dúvidas, o meu aspecto favorito do roteiro.

E, por último, eu gostaria de destacar a maneira com que a roteirista trabalha as temáticas presentes na narrativa. Primeiramente, há o mais óbvio, que é uma crítica à superficialidade dos relacionamentos por aplicativos de namoro, e como parece que o objetivo principal das pessoas (principalmente, homens) que usam esses aplicativos é levar as pessoas pelas quais elas se interessam para a cama. Isso é retratado de forma sarcástica e (infelizmente) realista em uma cena onde a protagonista propositalmente comete um erro para ver se o parceiro dela iria corrigi-lo, e ele não fala nada, imediatamente mudando de assunto. Outro exemplo dessa crítica é que as conversas por mensagens nesses aplicativos podem ir de algo “fofo” para algo impróprio BEM rapidamente, e Kahn novamente consegue fazer uso de um senso de humor ácido para retratar a realidade nua e crua, com máximo efeito.

Mas, além da crítica à modernização dos relacionamentos amorosos por aplicativos, há outra temática que, mesmo que mais sob um ponto de vista metafórico e simbólico, se faz tão presente no roteiro de Kahn quanto a anterior. Desde os minutos iniciais, é visível a maneira com que Cave e Kahn tratam a comida em “Fresh”, em especial pratos com carne. A câmera se aproxima dos pratos de forma extremamente incômoda, quase que encostando na comida, deixando o espectador desconfortável ao invés de com água na boca. Essa abordagem me fez pensar se, como em “Corra!”, os estereótipos do terror são usados para trabalhar uma temática sociopolítica. Da mesma maneira que o filme de Jordan Peele usa o filme como uma metáfora ao racismo, Mimi Cave usa “Fresh” como uma metáfora ao dualismo entre ingestão de carne e meios de vida como vegetarianismo e veganismo. Essa decisão faria mais sentido e ficaria ainda mais evidente se Kahn tivesse definido a personagem de Edgar-Jones como vegetariana ou vegana, mas funciona muito bem do jeito que foi apresentado.

Para não estragar a surpresa, vou parar a parte do roteiro por aqui. Só termino dizendo que a roteirista Lauryn Kahn e a diretora Mimi Cave mostram ter um talento extremamente promissor para fazer filmes que subvertem as expectativas do espectador. “Fresh” é 100% tenso, envolvente, relevante, sarcástico, empoderador, simbólico... Há tantos adjetivos que eu poderia usar para descrever esse filme, que eu levaria vários dias para citar todos. (Risos)

(There were two particular reasons for me to be really curious to check out “Fresh” when it released: the first one would be that it was considered one of the biggest hits in this year's Sundance Film Festival, a perfect scenario for new talents to emerge behind the camera and, maybe, even get nominations in their respective award seasons (as it happened with “CODA”, “Summer of Soul” and “Flee”, which were acclaimed and awarded in Sundance last year and got nominated in this year's Oscars); and the second one would be the extremely clever marketing campaign Hulu cooked up to promote the film. The streaming platform succeeded, through the promotional material, in making the viewer interested and curious towards watching it without showing anything that gave the plot's unraveling away, which was a masterful move.

I can't say I had high expectations to watch it, because, besides the aforementioned reasons and Sebastian Stan's (best known for Marvel fans as Bucky Barnes/Winter Soldier) presence in the cast, there was nothing else for me to base some consolidated expectations on. It's the directorial debut of director Mimi Cave, as well as one of the first works by screenwriter Lauryn Kahn, so I was completely uncapable of basing my expectations on a previous project by any members of this creative team. I watched “Fresh” almost completely blindly, unaware of how it would be the absolute best way of experiencing it. The film impressed me in such a way, that I'll make this review as brief as possible, so that it doesn't lose the element of surprise for you.

So, let's talk about the screenplay. It would be quite difficult to compare Kahn's narrative with any other without giving anything away, but I'll try my best. “Fresh” would be a very well blended mix of the subversion of horror tropes and symbolic approach in Jordan Peele's spectacular “Get Out”, with the themes that are present in films such as “Promising Young Woman” (which won the Oscar for Best Original Screenplay) and “Okja”, an international co-production by Netflix, directed by Bong Joon-ho, the same genius responsible by the amazing masterpiece that is “Parasite”. And, as the cherry on top, the tension present in the unnerving “Split”, by M. Night Shyamalan, is replicated in a perfect and realistic way here.

Firstly, I'd like to highlight the entertainment factor contained inside Kahn's screenplay. Even before the film takes off, full speed ahead, through the same paths as “Get Out” and “Split”, the viewers see themselves completely invested in the trajectory of the protagonist, portrayed by Daisy Edgar-Jones. Her frustration, mixed with her yearning to finally connect emotionally with somebody, is established perfectly in the film's first minutes. These mixed feelings are one of the main ways that Kahn uses to make the viewer feel sympathy towards her narrative arc and, mainly, towards the relationship between Edgar-Jones's and Sebastian Stan's characters. That device managed to remind me a lot of “Bridget Jones's Diary” and other rom-coms for some reason, which is funny, because the first 30 minutes are NOTHING like the rest of the film's runtime of nearly 2 hours.

And with that, we'll pass on to the second highlight of Kahn's script, which is its capacity of drastically subverting the viewer's expectations. It's something otherworldly. Just to exemplify how the film switches its tone (and how well Cave and Kahn manage to switch it without seeming like a rough change), do you know how, halfway through “Parasite”, Bong Joon-ho's Oscar-winning script ceases to be a dark humor comedy and starts being a high-tension thriller? Basically, the same thing happens here, in the 30-minute mark. It's really good (and original) to see how Kahn manages to work with two completely different genres, when it comes to tone, and how she writes both of them in an honest, surprising, realistic and unsettling way. This subversion of expectations and genres is, without a single question, my favorite part about the screenplay.

And lastly, I'd like to highlight the way the screenwriter deals with the themes present in the narrative. Firstly, there's the most obvious, which is criticism aimed towards the shallowness in dating through cellphone apps especifically built for it, and how it seems like the main objective of people (mostly, men) who use them is to get the other person to go to bed with them. This is portrayed in a sarcastic and (unfortunately) realistic way in a scene where the protagonist makes a mistake on purpose to see if her partner would correct it, which he doesn't, and he ends up completely changing the subject. Another example of that criticism is that texting through these apps could go from something “cute” to something inappropriate VERY fast, and Kahn again uses an acid sense of humor to portray the rawness and truthfulness of that reality, to maximum effect.

But, besides the criticism towards the modernization of dating through phone apps, there's another theme that, even though it's better interpreted in a metaphorical, symbolic way, is just as present in Kahn's screenplay as the previous one. Ever since the first few minutes, you can see the way that Cave and Kahn deal with the food in “Fresh”, especially dishes with meat in them. The camera zooms in on the dishes in a very uncomfortable way, almost if like touching them, leaving the viewer more uneasy than craving for that particular dish. That approach made me wonder if, just like in “Get Out”, the horror tropes are used to work with a particular sociopolitical theme. In the same way Jordan Peele uses his film as a metaphor for racism, Mimi Cave uses “Fresh” as a metaphor for the dualism between eating meat and other ways of life, such as vegetarianism and veganism. That decision would make more sense and would become all the more evident if Kahn had defined Edgar-Jones's character as a vegetarian or a vegan, but it works really well the way they made it.

In order for me to not ruin the surprise, I'll stop writing about the screenplay here. I'll just finish it by saying that screenwriter Lauryn Kahn and director Mimi Cave show us they have an extremely promising talent towards making films that subvert the viewers' expectations. “Fresh” is 100% tense, involving, relevant, sarcastic, empowering, symbolic... There would be so many adjectives I could use to describe it, that I'd take the whole day to list them all. (LOL))



Outra coisa que me impressionou bastante em “Fresh” foi como Cave conseguiu trabalhar com o roteiro de Kahn com um elenco bem reduzido de personagens, e a diretora conseguiu juntar uma dupla perfeita com Daisy Edgar-Jones e Sebastian Stan. Edgar-Jones (mais conhecida por seu papel aclamado na minissérie “Normal People”) consegue manipular suas emoções de maneira fluida, convincente e drasticamente realista. É incrível ver a atriz lidando com uma mistura entre a vulnerabilidade da sua personagem perante às situações da narrativa e a força e o caráter persistente de uma sobrevivente. O desempenho de Edgar-Jones aqui me lembrou muito da performance vencedora do Oscar da Brie Larson em “O Quarto de Jack”. Mal posso esperar pelos próximos projetos dela.

Outro destaque, é óbvio, fica com o nosso Soldado Invernal, Sebastian Stan. Ele consegue misturar muito bem o carisma, a simpatia e a personalidade de alguém ingênuo, recluso e tímido com a frieza, a distância e o caráter calculista de alguém genuinamente esperto e inteligente. Stan mostra aqui (juntamente com sua performance muito bem recebida pela crítica na minissérie “Pam & Tommy”) que consegue fazer MUITO mais do que somente meter porrada nas pessoas em filmes da Marvel. Atores em filmes de super-heróis não conseguem fazer só filmes de super-heróis muito bem, e Stan, assim como Scarlett Johansson, Margot Robbie, Florence Pugh, Brie Larson, Bradley Cooper e muitos outros, são prova disso. Realmente espero que Stan consiga mais papéis como esse no futuro.

Já no lado coadjuvante, temos a Jonica T. Gibbs e o Dayo Okeniyi, e as performances dos dois, em algum ponto do filme, me lembraram muito do personagem do Lil Rel Howery em “Corra!”. Ambos são os alívios cômicos de “Fresh”, e é bem interessante acompanhar o arco narrativo de seus personagens, o qual, assim como o de Howery no filme de Jordan Peele, mistura partes mais cômicas com aspectos mais investigativos, onde eles decidem investigar o que os está intrigando por conta própria. Mas a melhor parte é que, quando o espectador pensa que está ficando muito parecido com “Corra!”, o roteiro de Kahn está lá para puxar o tapete e subverter nossas expectativas mais uma vez, resolvendo as coisas de uma maneira mais original e inventiva, o que é ótimo.

(Another thing that impressed me a lot about “Fresh” was how Cave managed to work with Kahn's screenplay with a very reduced cast of characters, and the filmmaker managed to make a match made in heaven with Daisy Edgar-Jones and Sebastian Stan. Edgar-Jones (best known for her acclaimed role in the limited series “Normal People”) succeeds in manipulating her emotions in a fluid, convincing and drastically realistic way. It's incredible to see the actress dealing with a mix between her character's vulnerability towards the narrative's situations and the strength and persistence of a survivor. Edgar-Jones's astounding work here reminded me a lot of Brie Larson's Oscar-winning performance in “Room”. I can't wait to see what she does next.

Another highlight, obviously, stays with our Winter Soldier, Sebastian Stan. He manages to perfectly mix the charisma, sympathy and personality of someone that's naïve and a bit shy with the coldness, the distance and the calculist nature of a genuinely smart and clever person. Stan shows here (along with his very well-received performance in the limited series “Pam & Tommy”) that he can do SO MUCH more than just punching people in Marvel movies. Actors who do superhero films can genuinely act in more than just superhero films, and Stan's performances, alongside the likes of Scarlett Johansson, Margot Robbie, Florence Pugh, Brie Larson, Bradley Cooper and others, are just further proof of that. I really hope that Stan gets offered more roles like this one in the future.

On the supporting side, we have Jonica T. Gibbs and Dayo Okeniyi, and both of their performances, at some point, really reminded me of Lil Rel Howery's character in “Get Out”. They're both the comic reliefs of “Fresh”, and it's pretty interesting to follow their narrative arcs, which, as it is with Howery, mixes some comedy and dark-humored parts with some more investigative aspects, where they decide to investigate what's intriguing them on their own. But the best part about their performances is that, when the viewer thinks it's getting too similar to “Get Out”, Kahn's screenplay is there to pull the rug from under our feet once again, sorting things out in an original and inventive way, which is great.)




Como dito anteriormente, a diretora Mimi Cave usa os aspectos técnicos de “Fresh” para trabalhar e aprofundar as temáticas propostas pelo roteiro de Lauryn Kahn, uma abordagem muito interessante, na minha opinião. A direção de fotografia do Pawel Pogorzelski me lembrou bastante da estética visual do subestimado filme “Vingança”, da francesa Coralie Fargeat, pelo uso inventivo e inteligente de close-ups e tomadas aproximadas. Essa escolha criativa acaba por acentuar ambas as temáticas trabalhadas na narrativa: tanto a dos relacionamentos (por exemplo, com closes na boca dos personagens de Edgar-Jones e Stan, para destacar a sensualidade e a atração física entre os dois) quanto a mais simbólica do vegetarianismo (com closes extremamente próximos dos pratos ou perto de uma boca mastigando a comida em câmera lenta). É um trabalho técnico excelente, que ajuda a construir a tensão predominante na trama.

A montagem do Martin Pensa e a direção de arte são outros destaques. Eu gostei muito de como o trabalho de Pensa faz tanto o uso de cortes rápidos quanto o uso de tomadas mais prolongadas e dinâmicas para criar essa atmosfera de tensão. Assim como o roteiro de Kahn, a montagem consegue ser bem subversiva e sempre em movimento, o que é ótimo. Eu achei bem interessante o fato das diferenças na personalidade dos dois protagonistas ser visível na direção de arte das casas deles. Enquanto a casa da personagem de Edgar-Jones é espontânea, cheia de coisas espalhadas pra lá e pra cá, a casa do personagem de Stan é cuidadosamente simétrica, a ponto de ficar assustador de tão quieta, vazia e isolada. Achei isso bem legal.

Honestamente, eu não consegui achar um trabalho consistente na trilha sonora original do Alex Somers. Pela proposta do roteiro, eu esperava algo parecido com o trabalho do Colin Stetson em “Hereditário” ou do Michael Abels nos filmes do Jordan Peele, mas essa expectativa acabou não se concretizando. Há algumas boas músicas espalhadas ao longo da trama, como “Perfect Day”, do Lou Reed, que inclusive é usada como alívio cômico, de forma bem sarcástica. Eu, sinceramente, usaria a trilha sonora para trabalhar a mudança de tom entre os dois gêneros do filme. No início, poderiam ser usadas canções mais brandas e melódicas do Arcade Fire ou dos Smashing Pumpkins, e ao longo do filme, poderiam usar músicas mais tematicamente sombrias, como as do Nirvana e dos Nine Inch Nails. Acho que teria sido uma boa oportunidade para trabalhar a atmosfera pela trilha sonora.

(As previously stated, director Mimi Cave uses the technical aspects of “Fresh” in order to work with and deepen the themes proposed by Lauryn Kahn's screenplay, a very interesting approach, in my opinion. Pawel Pogorzelski's cinematography reminded me a lot of the visual aesthetic in the underrated film “Revenge”, from French filmmaker Coralie Fargeat, for its inventive and clever use of close-ups and approximated shots. That creative choice ends up highlighting both themes worked in the narrative: both the one about the relationships (for example, with close-ups and zoomed-in shots of the mouths of Edgar-Jones's and Stan's characters, to highlight the sensuality and the physical attraction between both characters) and the more symbolic one about vegetarianism (with extremely close shots of the dishes or of a mouth slowly chewing food in slow-motion). It's an excellent technical work, that helps building the tension in the plot.

Martin Pensa's editing and the production design deserve some highlights. I really liked how Pensa's work uses both rapid, quick, blink-and-you'll-miss-it cuts and longer, more dynamic and fluid shots in order to create that atmosphere of tension. As well as Kahn's script, the editing manages to be really subversive and always in motion, which is great. I thought that the fact that the differences between the two protagonists' personalities are partially worked through the art direction in their houses was quite interesting. While the house of Edgar-Jones's character is spontaneous, with lots of stuff spread out here and there, the house of Stan's character is carefully symmetric, to the point it's almost scary how quiet, empty and isolated it is. I thought that was really cool.

Honestly, I couldn't find some consistent work in Alex Somers's original score. By the screenplay's proposal, I was expecting something more akin to Colin Stetson's score in “Hereditary” or Michael Abels's work in Jordan Peele's films, but that expectation ended up not becoming a reality. There are some good songs sprinkled throughout the plot, such as Lou Reed's “Perfect Day”, which, by the way, is used as comic relief, in a very sarcastic way. I, honestly, would use the soundtrack to work with the tone change between the film's two genres. At first, there could be some more mellow, melodical songs by Arcade Fire and the Smashing Pumpkins, and throughout the film, they could've used some thematically darker songs, such as some by Nirvana or the Nine Inch Nails. I think it would've been a good opportunity to work with the atmosphere through music.)



Resumindo, “Fresh” é a primeira grata surpresa de 2022. Iniciando e fortalecendo a carreira de tanto a diretora Mimi Cave quanto a roteirista Lauryn Kahn com uma obra essencialmente subversiva, o filme conta com um roteiro inteligente, surpreendente e simbólico; performances altamente convincentes e manipuladoras de seus dois protagonistas extremamente talentosos e aspectos técnicos que acentuam a atmosfera predominante de tensão proposta pela narrativa. Um filme perfeito para quem gosta de um filme de gênero com algo a mais a dizer.

Nota: 9,5 de 10!!

É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,

João Pedro

(In a nutshell, “Fresh” is 2022's first pleasant surprise. Starting off and elevating the careers of both director Mimi Cave and screenwriter Lauryn Kahn with an essentially subversive piece, the film relies on a smart, surprising and symbolic screenplay; highly convincing and manipulative performances by its two extremely talented protagonists and technical aspects that constantly elevate the predominant atmosphere of tension proposed by the narrative. A perfect film for those who like a genre flick with something more to say.

I give it a 9,5 out of 10!!

That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,

João Pedro)