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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para falar sobre um dos lançamentos mais recentes em exibição nos cinemas! Sendo uma sequência direta de um clássico cult de terror dos anos 1990, e contando com a ajuda de um dos cineastas mais originais do gênero na atualidade, o filme em questão consegue entregar uma mistura quase perfeita entre terror convencional e comentários sociopolíticos, resultando em uma sequência mais autêntica, metafórica e relevante do que o filme original. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “A Lenda de Candyman”. Vamos lá!
(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to talk about one of the most recent releases showing exclusively in movie theaters! Being a direct sequel to a '90s horror cult classic, and relying on the help of one of the most original genre filmmakers of our time, the film I'm about to review manages to deliver an almost perfect mix between conventional horror and sociopolitical commentary, resulting in a sequel that's more authentic, metaphorical and relevant than the original film. So, without further ado, let's talk about 2021's “Candyman”. Let's go!)
Ambientado 30 anos após os eventos de “O Mistério de Candyman” (1992), o filme acompanha Anthony McCoy (Yahya Abdul-Mateen II), um artista visual que encontra dificuldades ao planejar suas novas obras. Após ouvir falar de uma lenda urbana originada em um conjunto habitacional em Chicago, Anthony pesquisa e explora mais sobre o complexo, agora gentrificado. Ao descobrir a história real de uma figura misteriosa que assombrava o bairro de um morador local (Colman Domingo), Anthony acidentalmente abre uma porta para o passado brutal e complexo do conjunto habitacional, desafiando sua própria sanidade e libertando uma onda aterrorizante de violência no processo.
(Set 30 years after the events of “Candyman” (1992), the film follows Anthony McCoy (Yahya Abdul-Mateen II), a visual artist who has difficulties in planning his new artistic work. After hearing about an urban legend originated in a housing project in Chicago, Anthony researches and explores further on the now gentrified neighborhood complex. When he discovers the real story of a mysterious figure that haunted the surroundings from a local resident (Colman Domingo), Anthony unknowingly opens a door to the housing project's brutal and complicated past, unraveling his own sanity and unleashing a terrifying wave of violence in the process.)
Minhas expectativas para assistir “A Lenda de Candyman” estavam baseadas no que provavelmente seria a mesma razão para que a grande maioria dos espectadores estivesse animada para conferir o filme: o envolvimento próximo de Jordan Peele na produção. Para aqueles que ainda não estão familiarizados com o nome (o que eu acho praticamente impossível), Peele foi responsável por nos trazer um dos melhores filmes de terror dos últimos tempos com sua estreia na direção, “Corra!”, longa-metragem que mistura recursos convencionais do gênero e temas sociopolíticos relevantes com perfeição, e que acabou rendendo ao diretor o Oscar de Melhor Roteiro Original. Além de “Corra!”, Peele também nos brindou com “Nós”, outro excelente filme de terror que, mesmo não conseguindo reter a relevância do filme anterior, conseguiu entregar uma boa dose de sustos e reviravoltas muito eficientes.
Inclusive, eu ouvi falar da franquia “Candyman” pela primeira vez com o anúncio deste novo filme, comandado pela diretora em ascensão Nia DaCosta, que já foi contratada pela Marvel Studios para dirigir a sequência de “Capitã Marvel”. Curioso para ver o que DaCosta e Peele iriam explorar nesta sequência, fui assistir o filme original dos anos 1990, e confesso que, na primeira vez, não achei grande coisa. Lembro que achava que “O Mistério de Candyman” era um slasher bem convencional, mas foi o pano de fundo da figura do Candyman que me chamou a atenção. Quando revi o filme ontem, antes de assistir à sequência, posso dizer que gostei bem mais do que eu me lembrava. É um filme bem eficiente, que faz uso de jumpscares e recursos de terror psicológico para fazer com que os outros personagens duvidem da protagonista, resultando em uma experiência enervante, imprevisível e, de fato, assustadora.
Mas, levando em conta o teor sociopolítico das produções de Jordan Peele, em especial seu primeiro filme, deduzi que a diretora Nia DaCosta iria levar o conceito do longa original para um lado mais metafórico, andando de mãos dadas com a relevância do movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam) para entregar algo que explora mais a fundo o que o filme dos anos 1990 introduziu de uma maneira superficial. E fico muito feliz em dizer que a sequência de DaCosta não só respeita os eventos apresentados no primeiro filme, como também introduz um ponto de vista mais autêntico e socialmente relevante que se comunica de maneira extraordinária com eventos reais.
Ok, vamos falar do roteiro. Escrito por DaCosta, Peele e Win Rosenfeld, o enredo de “A Lenda de Candyman” tem como um dos seus conceitos centrais a gentrificação. Mas o que exatamente é gentrificação? Basicamente, é um processo de transformação urbana que “expulsa” moradores de bairros periféricos e transforma essas regiões em áreas nobres para pessoas com uma renda financeira maior. Fenômeno causado pela descentralização das áreas e bairros desenvolvidos de uma metrópole, as regiões até então consideradas periféricas começam a ser ressignificadas e modernizadas, aumentando o aluguel e custo de vida daquela área.
Isso resulta, então, na “expulsão” dos moradores originais daquela área, que vão viver em locais ainda mais afastados e precários, classificando a gentrificação como um processo de segregação urbana. Este conceito é utilizado de maneira fantástica pelos roteiristas, especialmente levando em conta os eventos do filme original, onde o conjunto habitacional Cabrini-Green era retratado como um local precário, vandalizado e habitado em sua maioria por pessoas negras com rendas menores. Na sequência, ambientada 30 anos depois, a história do filme original claramente trouxe muita visibilidade e valorização para o bairro, resultando na gentrificação de Cabrini-Green.
Um dos maiores acertos dos roteiristas foi a escolha de respeitar e dar sequência à mitologia estabelecida em “O Mistério de Candyman”, mas ao mesmo tempo, não fazer com que o espectador tenha que obrigatoriamente assistir ao filme anterior para compreender a sequência. Claro, se você assistiu ao filme original antes de assistir “A Lenda de Candyman”, ótimo, porque aí todo um pano de fundo adicional se abre para você. Mas DaCosta, Peele e Rosenfeld encontram maneiras muito inteligentes de inteirar o espectador sobre a história do filme original, fazendo com que não seja absolutamente necessário assistir o primeiro para entender este.
Há um uso bem criativo de flashbacks aqui: além de utilizar sequências em live-action, há algumas cenas executadas usando somente fantoches de sombra. Talvez o mais mágico sobre estas sequências com os fantoches seja a capacidade que elas têm de expressarem suas mensagens sem o uso de palavras ou narrações em voice-over. Eu gostei bastante disso e queria que elas tivessem sido usadas em maior quantidade ao longo do filme.
Outro acerto dos roteiristas foi o teor sociopolítico da narrativa, a qual foi somente explorada superficialmente no filme de 1992, resultando em um ponto de vista mais autêntico, original e relevante. Ao contrário do primeiro filme, que foi escrito, dirigido e protagonizado por pessoas brancas, “A Lenda de Candyman” é enraizado nas origens negras da história do personagem-título, sendo dirigido, escrito e protagonizado por pessoas negras. Isso acaba por abrir um leque inteiro de possibilidades para os roteiristas explorarem e irem além dos recursos convencionais e sobrenaturais do filme original.
Eu adoro quando filmes de terror utilizam aspectos derivados da fantasia para abordar temas realistas, os quais acabam por adicionar uma camada extra à profundidade da obra. Assim como “It: A Coisa” faz uso de um palhaço interdimensional para falar sobre luto, perda, abuso e assédio; “A Lenda de Candyman” usa o personagem-título como uma representação metafórica brilhante do racismo e da injustiça que as pessoas negras sofreram (e, infelizmente, ainda sofrem) pelas mãos de pessoas brancas ao longo dos anos, seja na época da escravidão ou nos dias atuais, tomando como exemplo os recentes assassinatos de George Floyd e Breonna Taylor por policiais brancos nos EUA, que resultaram em protestos do movimento Black Lives Matter.
Há uma cena nesta sequência que representa de forma perfeita o que o Candyman deveria ter representado no filme original. Nela, o protagonista e o personagem do Colman Domingo estão repassando pela história das pessoas negras do bairro Cabrini-Green que sofreram pelas mãos de pessoas brancas, através de flashbacks. Aí, o personagem de Domingo fala que o Candyman é uma história que os habitantes de Cabrini-Green criaram para lidar com essas situações brutais de racismo, preconceito e injustiça. Para mim, era essa profundidade sociopolítica que faltava para que o filme de 1992 cimentasse seu lugar no cânone de melhores filmes de terror dos anos 1990.
Mas, mesmo que o filme tenha esse viés sociopolítico muito forte, DaCosta, Peele e Rosenfeld, felizmente, não esqueceram da violência grotesca que marcou o original. A diretora consegue criar cenas de terror que priorizam a atmosfera para depois partir para a violência explícita. DaCosta faz um uso brilhante de perspectiva em algumas dessas sequências, às vezes para não parecer gratuito demais, mas principalmente para estabelecer um tom mais enervante e misterioso, que, na minha opinião, dá de mil em qualquer susto barato que se pode conceber. Há até algumas partes que me lembraram bastante de filmes de terror corporal, como “O Enigma de Outro Mundo” e “A Mosca”, especialmente ao desenvolver o protagonista ao longo da trama.
A mitologia construída ao longo do longa-metragem é muito interessante. Seja através dos flashbacks anteriormente mencionados ou de aparições de personagens do filme original, os três roteiristas conseguem, ao mesmo tempo, criar uma história que anda com os próprios pés e adicionar conceitos muito ricos e socialmente relevantes para uma franquia já existente. Posso dizer com tranquilidade que “A Morte do Demônio”, “A Maldição de Chucky” e “A Lenda de Candyman” são alguns dos exemplos de reboots ou sequências que revitalizam com vigor as franquias as quais eles pertencem, ao mesmo tempo que contam uma história completamente nova, que certamente irá atrair uma nova geração de espectadores e fãs.
A única coisa que poderia ter sido um pouco melhor no roteiro de “A Lenda de Candyman” é a duração. A história se movimenta muito bem em um tempo relativamente curto de 1 hora e 31 minutos, mas há certas subtramas e reviravoltas que têm potencial e, devido às restrições impostas pela duração, não são desenvolvidas o suficiente para terem um maior impacto na mente do espectador. Há uma subtrama, por exemplo, que iria trazer uma quantidade bem aprofundada de desenvolvimento para uma das personagens centrais. Mas, como o enredo escolhe focar em alguns outros pontos narrativos, essa subtrama não se desenvolve o suficiente para dar uma guinada no desenvolvimento dessa personagem.
Resumindo, o roteiro de “A Lenda de Candyman” equilibra muito bem o terror grotesco que marcou o original e os temas sociopolíticos presentes nas obras do produtor Jordan Peele, resultando em um longa-metragem que, ao mesmo tempo, revitaliza vigorosamente uma franquia que ficou inativa por muito tempo, e cria uma história totalmente nova e socialmente relevante, que certamente irá atrair uma nova geração de fãs.
(My expectations to watch “Candyman” were based on what probably would be the reason most viewers were excited to check out the film: the close involvement of Jordan Peele in the production. To those who aren't familiar with that name (although I think that's impossible), Peele was responsible for giving us one of the best horror films in recent years with his directorial debut, “Get Out”, a film that perfectly blends conventional genre tropes with relevant, thought-provoking sociopolitical themes, and that ended up giving the filmmaker an Oscar for Best Original Screenplay. Besides “Get Out”, Peele also gave us “Us”, another excellent horror film that, even though it doesn't have the previous film's social relevance, still managed to deliver a healthy dose of effective scares and twists.
As a matter of fact, I heard about the “Candyman” franchise when they announced the making of this new film, helmed by rising director Nia DaCosta, who has been already hired by Marvel Studios to direct “The Marvels”, a sequel to 2019's “Captain Marvel”. Curious to see what DaCosta and Peele would explore in this sequel, I checked out the original '90s film, and I confess, I didn't think it was that big of a deal. I remember thinking that 1992's “Candyman” was a pretty conventional slasher flick, but it was the background of the Candyman character that caught my attention. When I rewatched it yesterday, before watching the sequel, I liked it a whole lot better than I could remember. It's a really effective film, that makes use of jumpscares and psychological horror tropes to make every other character doubt the main one, resulting in an unnerving, unpredictable and, indeed, scary experience.
But, taking into account the sociopolitical vein of Jordan Peele's productions, especially his first feature film, I deducted that director Nia DaCosta would lead the original concept towards a more metaphorical territory, walking hand-in-hand with the relevance of the Black Lives Matter movement to deliver something that explored what the 1990s film introduced on a much deeper level. And I'm really glad to say that DaCosta's sequel not only respects the events of the previous film, but also introduces a more authentic and socially relevant point of view that communicates extraordinarily well with real-life events.
Okay, let's talk about the screenplay. Written by DaCosta, Peele and Win Rosenfeld, the plot for 2021's “Candyman” has gentrification as one of its main concepts. But what exactly is gentrification? Basically, it's a process of urban transformation that “evicts” inhabitants of precarious neighborhoods and transforms these regions into noble areas for people with a bigger financial income. A phenomenon caused by the de-centralization of a metropolis's developed areas and neighborhoods, the regions that, until then, were considered precarious are re-significated and modernized, increasing the value of rent and cost of life there.
This results, then, in the “eviction” of that area's original inhabitants, who'll go on to live in areas that are even more precarious and distant, classifying gentrification as a process of urban segregation. That concept is used in a fantastic way by the screenwriters, especially if you take the original film's events into account, where the Cabrini-Green housing projects were portrayed as a precarious, vandalized place who was inhabited mostly by Black people with smaller incomes. In the sequel, set 30 years after that, the story of the original film has clearly brought visibility and value to the neighborhood, resulting in the gentrification of Cabrini-Green.
One of the screenwriters' greatest choices was to respect and continue the mythology established in 1992's “Candyman”, but at the same time, not making it mandatory to watch the original film in order to understand the sequel. Sure, if you watched the original film before watching 2021's “Candyman”, that's great, as a whole new additional background will be open to you. But DaCosta, Peele and Rosenfeld find very clever ways to acquaint the viewer on the original film's story, in a way that it's not absolutely necessary to watch the first one in order to understand this one.
There's a very creative use of flashbacks here: besides the usual live-action sequences, there are some flashback scenes that are executed using only shadow puppetry. And perhaps the most magical thing about these puppetry sequences is that words and voice-over narrations are not necessary in order for them to convey their message. I really, really liked these scenes, and I wish there were more of them throughout the film.
Another thing that the screenwriters did right was the narrative's sociopolitical context, which was only superficially explored in the 1992 film, resulting in a more authentic, original and relevant approach to the story. Unlike the first film, which was written, directed and starred by white people, 2021's “Candyman” firms its roots in the title character's Black origin background, being directed, written and starred by Black people. This ends up opening a new array of possibilities for the screenwriters to further explore the original story, going beyond the original film's conventional and supernatural tropes.
I love it when horror films use fantasy aspects to talk about real-life issues, which end up adding a whole new layer to the work's depth. Just like “It” uses an interdimensional clown to talk about grief, loss, abuse and harassment; “Candyman” uses the title character as a brilliant metaphorical representation of the racism and social injustice that Black people have suffered (and, unfortunately, still suffer) by the hands of white people throughout the years, whether it's during the slavery period or in our recent times, like the recent murders of George Floyd and Breonna Taylor by white police officers in the US, which resulted in protests by the Black Lives Matter movement.
There's a scene in this sequel that perfectly represents what Candyman should've represented in the original film. In it, the protagonist and Colman Domingo's character are going through the stories of all the Black people in the Cabrini-Green neighborhood who have suffered by the hands of white people, though flashbacks. Then, Domingo's character says that Candyman is a story that the inhabitants of Cabrini-Green made up to deal with these brutal situations of racism, prejudice and social injustice. To me, that sociopolitical depth was what was missing in the original film, so that it could cement its place among the best horror films of the 1990s.
But, even though the film has this very strong sociopolitical vein, DaCosta, Peele and Rosenfeld, fortunately, haven't forgotten the grotesque violence that made the original one such a hit. The director manages to create horror scenes that prioritize the atmosphere and move on to explicit violence later on. DaCosta makes a brilliant use of perspective in some of these scenes, sometimes so it doesn't seem gratuitous, but mostly to establish a more unnerving, mysterious tone, which, for me, is much, much better than any jumpscare horror directors are able to conceive. There are even some parts that reminded me of body horror films, such as “The Thing” and “The Fly”, especially when developing the protagonist throughout the plot.
The mythology that's built throughout the film is very interesting. Whether it's through the previously mentioned flashbacks, or through appearances by characters from the original film, the screenwriting trio manages to, at the same time, create a story that walks on its own two feet and add very rich and socially relevant concepts to an existing franchise. I can safely say that 2013's “Evil Dead”, “Curse of Chucky” and 2021's “Candyman” are some of the examples of movie sequels or reboots that vigorously breathe new life into their respective franchises, and at the same time, they tell a completely new story, that'll certainly be attractive to a new generation of fans and enthusiasts.
The only thing that could've been worked upon a little better in the screenplay for “Candyman” is the runtime. The story moves really well throughout its relatively short running time of 1 hour and 31 minutes, but there are certain subplots and plot twists here that have potential, and, due to the narrative boundaries imposed by the runtime, they aren't developed enough to leave a bigger mark on the viewer's mind. There's a subplot, for example, that would bring a hefty amount of deep development to one of the film's central characters. But, as the plot chooses to focus on other narrative points, that subplot isn't well developed enough to turn that character's development the other way around.
To sum it up, 2021's “Candyman” balances really well the grotesque violence that made the original a hit and the sociopolitical themes in producer Jordan Peele's work, resulting in a feature film that, at the same time, vigorously breathes new life into a franchise that had been dormant for a large amount of time, and creates a completely new, socially relevant story that'll certainly attract a new generation of fans.)
O elenco de “A Lenda de Candyman” é muito talentoso, mas, seja pelas escolhas do roteiro ou pela duração curta do filme, certos atores não conseguem alcançar seu máximo potencial aqui. Eu adorei o desenvolvimento do Yahya Abdul-Mateen II como protagonista. A obsessão do personagem dele em planejar suas novas pinturas e fazer sucesso com elas me lembrou muito do desenvolvimento do Dr. Seth Brundle, interpretado por Jeff Goldblum no clássico “A Mosca”, de David Cronenberg. Há toda uma transformação que o personagem dele sofre ao longo do filme, e o que eu mais gostei do desenvolvimento dele é justamente a ambiguidade dessa transformação. Ela pode ser levada ao pé da letra, e de fato, esta é a escolha do roteiro, mas também pode ser interpretada de modo simbólico, como se o personagem de Abdul-Mateen II estivesse sendo dominado por essa obsessão que o define, e o ator trabalha essa ambiguidade muito bem.
A Teyonah Parris está maravilhosa aqui. Eu já tinha gostado muito do papel dela em “WandaVision”, e em “Candyman”, ela é responsável por manter os pés do protagonista fincados na realidade, o que é mais ou menos o que o Xander Berkeley fez em relação à personagem da Virginia Madsen no filme original. Além do filme ser uma jornada de inspiração e autoconhecimento para o protagonista, Parris também assume um papel de protagonismo aqui, como se a narrativa fosse todo um processo para que ela acreditasse no personagem principal. Há uma subtrama que adicionaria ainda mais à performance da atriz, mas o roteiro, infelizmente, não encontra o tempo para desenvolvê-la propriamente.
Se a personagem de Parris tenta manter os pés do protagonista no chão, o personagem do Colman Domingo os levanta ainda mais em direção às alturas. Um dos melhores personagens do filme, de longe, Domingo fica responsável quase que exclusivamente pela exposição dos eventos do filme anterior, para avançar no desenvolvimento dos outros personagens. Mas Domingo se entrega de coração e alma ao papel, fazendo uso de gestos e expressões faciais que adicionam um quê a mais de realismo à estas cenas de exposição, como se o ator estivesse presente nestas cenas em tempo real e estivesse contando-as diretamente para o espectador, que percebe que o personagem passou por muita coisa.
A aparição da Vanessa Williams, atriz do filme original, foi algo bem legal de se ver. A única interação entre Williams e Abdul-Mateen II é uma das melhores cenas do filme, e é exatamente o que faz de “A Lenda de Candyman” uma sequência ao invés de um reboot. Tendo como base o trabalho incrível dele na série “Utopia”, esperava um pouco mais da performance do Nathan Stewart-Jarrett. Aqui, ele é o alívio cômico da vez e a grande maioria das piadas funciona, mas a fisicalidade do ator pode ser um pouquinho exagerada e estereotipada, levando em conta a personalidade de seu personagem.
(The cast of 2021's “Candyman” is really talented, but, whether it's because of screenplay choices or the film's short runtime, some actors aren't able to reach their full potential. I loved Yahya Abdul-Mateen II's development as the protagonist. His character's obsession in coming up with new artistic work and being famous for it reminded me a lot of the development for Dr. Seth Brundle, portrayed by Jeff Goldblum in the classic “The Fly”, directed by David Cronenberg. There's this whole transformation that his character goes through throughout the film, and what I liked the most about his development is the ambiguous tone of that transformation. Sure, it can be taken seriously and most literally, and indeed, that's the screenwriters' choice, but it can also be interpreted in a symbolic way, as if Abdul-Mateen II's character was slowly being dominated by this obsession that defines him, and the actor works with that ambiguity really well.
Teyonah Parris is wonderful here. I had already really liked her role in “WandaVision”, and in “Candyman”, she is responsible for keeping the protagonist's feet on the ground, much like what Xander Berkeley did for Virginia Madsen's character in the original film. Besides the film being a journey of inspiration and discovery for the protagonist, Parris also assumes a main role here, as if the narrative was a whole process for her to believe the main character. There's a subplot that would add a whole new layer to the actress's performance, but the screenplay, unfortunately, doesn't find the time to develop it properly.
If Parris's character tries to keep the protagonist's feet on the ground, Colman Domingo's character lifts them even higher towards the sky. One of the best characters in the film, by far, Domingo is almost exclusively responsible for the exposition of the original film's events, to advance the development of other characters. But Domingo gives his heart and soul to the role, using gestures and facial expressions that add a more realistic tone to these exposition scenes, as if the actor was in those scenes in real time and was telling them directly to the viewer, who realizes that the character has been through a lot.
The appearance by Vanessa Williams, an actress from the original film, was really nice. The only interaction between Williams and Abdul-Mateen II is one of the film's best scenes, and it is exactly what makes this “Candyman” a sequel rather than a full-on reboot. Based on his incredible work in the TV series “Utopia”, I expected a lot more from Nathan Stewart-Jarrett's performance. Here, he's a full-on comic relief and the larger part of the funny gags and jokes works, but the actor's physical performance can be a little over-the-top and stereotyped, considering his character's personality.)
Os aspectos técnicos de “A Lenda de Candyman” são utilizados de maneira bem criativa e contida, com o objetivo de não tornar as cenas mais violentas gratuitas demais e focar em pontos narrativos que acentuariam o tom metafórico da narrativa. A direção de fotografia do John Guleserian e a montagem da Catrin Hedström trabalham em conjunto para criar cenas enervantes que priorizam a atmosfera à violência explícita. Como dito anteriormente, a diretora Nia DaCosta trabalha muito bem o aspecto da perspectiva, e isso é refletido de maneira brilhante no trabalho de Guleserian e Hedström.
Por exemplo, há uma cena onde alguns personagens dizem Candyman 5 vezes em frente à um espelho, com o objetivo de invocá-lo “de brincadeirinha”. Quando eles falam a palavra pela quinta vez, a cena corta para um plano mais detalhista. Depois de algumas trocas de diálogo, a cena volta para um plano mais geral, e dá pra perceber que mais alguma coisa está lá com os personagens. São cenas do tipo que “se você piscar, você perde”, então vale a pena ficar de olho.
A direção de arte consegue replicar muito bem alguns aspectos visuais e estéticos marcantes do primeiro filme, como o vandalismo presente na vizinhança de Cabrini-Green e a presença de doces com pequenas navalhas dentro. Há algumas cenas onde a paleta de cores dominante é da cor do mel, e eu achei isso bem interessante, já que um dos maiores símbolos do personagem-título é um enxame de abelhas o rodeando. Há um uso bem consolidado de efeitos práticos, especialmente quando se diz respeito às cenas de violência e terror corporal, o que eu achei absolutamente revigorante, levando em conta a dominação do CGI em blockbusters nos dias atuais.
E, por fim, a trilha sonora original, composta pelo Robert A. A. Lowe, faz um ótimo trabalho em acentuar o tom perturbador e enervante que a diretora Nia DaCosta deseja evocar com o filme. São faixas compostas por arranjos em constante crescimento, onde ela começa com um instrumento, e ao longo da faixa, o número de instrumentos aumenta cada vez mais, resultando em uma verdadeira amálgama de ruídos ao final da peça, propositalmente composta para causar incômodo no espectador, e eu achei isso brilhante.
(The technical aspects of 2021's “Candyman” are used in a very creative and contained way, with the objective of not making the more violent scenes too gratuitous and focusing on narrative points that would enhance the narrative's metaphorical tone. John Guleserian's cinematography and Catrin Hedström's editing work hand-in-hand to create unnerving scenes that prioritize atmosphere over explicit violence. As previously stated, director Nia DaCosta works really well with the aspect of perspective, and that is reflected brilliantly in Guleserian and Hedström's work.
For example, there's a scene where some characters say Candyman five times in front of a mirror, with the objective of summoning him “as a joke”. When they say the word for the fifth time, the scene cuts to a more detailed frame of the situation. After a few dialogue exchanges, the scene goes back to the more general frame, and you are able to notice that there is something else there with the characters. These are scenes of the “blink and you'll miss it” category, so keep your eyes peeled.
The production design manages to replicate really well some visual and aesthetic aspects that marked the first film, such as the vandalism in the Cabrini-Green neighborhood projects and the presence of candy with small razor blades in them. There are some scenes in where the dominant color palette is the color of honey, and I found that to be quite interesting, as one of the title character's greatest symbols is a swarm of bees surrounding him. There's a very solid use of practical visual effects, especially when it comes to the violent and body horror scenes, which I found to be absolutely invigorating, considering CGI's domination over blockbusters in present day.
And, at last, the original score, composed by Robert A. A. Lowe, does a great job in enhancing the disturbing and unnerving tone that director Nia DaCosta wishes to evoke with the film. These are tracks composed by arrangements in constant growth, where it starts with one single instrument, and throughout the track, the number of instruments grows even higher, resulting in a real collection of noises at the end of the piece, purposefully composed to discomfort the viewer, and I thought that was brilliant.)
Resumindo, “A Lenda de Candyman” é aquele raro filme que revitaliza vigorosamente uma franquia dormente e, ao mesmo tempo, cria uma história completamente nova para atrair uma nova geração de fãs e espectadores. A diretora e roteirista Nia DaCosta, trabalhando em conjunto com o roteirista e produtor Jordan Peele, consegue entregar uma sequência mais autêntica, original, metafórica e socialmente relevante do que o filme original, contando com a ajuda de um elenco super talentoso e aspectos técnicos essencialmente atmosféricos para fazer isso.
Nota: 9,5 de 10!!
É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,
João Pedro
(In a nutshell, 2021's “Candyman” is that rare film that vigorously breathes new life into a dormant franchise and, simultaneously, creates a completely brand-new story in order to attract a new generation of fans and viewers. Writer-director Nia DaCosta, working in tandem with writer and producer Jordan Peele, manages to deliver a sequel that's more authentic, original, metaphorical and socially relevant than the original film, relying on the help of a super-talented cast and essentially atmospheric technical aspects in order to do so.
I give it a 9,5 out of 10!!
That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,
João Pedro)
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ResponderExcluirNào conhecia! Pela resenha, vale a pena assistir né 👏👏👏👏😀👍
ResponderExcluirJP, a resenha me motivou a ver o filme!! Parabéns 👏👏👏👏👏
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