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domingo, 30 de janeiro de 2022

"O Beco do Pesadelo": nem só de fantasia vive Guillermo del Toro (Bilíngue)

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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para falar sobre um dos lançamentos mais recentes nos cinemas, e o novo filme de um dos meus diretores favoritos! Encontrando o seu diretor fora de sua zona de conforto e contando com performances competentes de um elenco imensamente talentoso, o filme em questão é um suspense psicológico sensacional, que funciona tanto como um estudo de personagem para seu protagonista, quanto como um conto moralista sombrio sobre os efeitos colaterais da manipulação e da corruptibilidade humana. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “O Beco do Pesadelo”. Vamos lá!

(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to talk about one of the most recent releases now showing on theaters, and the new film by one of my all-time favorite directors! Finding its director outside his comfort zone and relying on competent performances by an immensely talented cast, the film I'm about to review is a sensational psychological thriller, which works both as a character study for its protagonist, and as a dark morality tale on the side effects of manipulation and human corruptibility. So, without further ado, let's talk about “Nightmare Alley”. Let's go!)



Baseado no romance “O Beco das Ilusões Perdidas”, escrito por William Lindsay Gresham, o filme acompanha Stanton “Stan” Carlisle (Bradley Cooper), um misterioso e ambicioso ajudante de um circo itinerante, que possui o talento de manipular as pessoas com algumas palavras bem escolhidas. Fugindo do circo com sua colega Molly (Rooney Mara), Stanton acaba organizando um show bem lucrativo de telepatia para ganhar a vida. Certo dia, ele faz uma parceria com uma psiquiatra (Cate Blanchett) tão manipuladora quanto ele, e essa aliança leva Stan em uma jornada extremamente perigosa, da qual será bem difícil voltar atrás.

(Based on the novel of the same name, written by William Lindsay Gresham, the film follows Stanton “Stan” Carlisle (Bradley Cooper), a mysterious, ambitious carny for a traveling carnival troupe, who has a talent for manipulating people with a few well-chosen words. Running away from the carnival with his stage partner Molly (Rooney Mara), Stanton ends up putting together a highly profitable mind-reading act in order to make a living. One day, he forms a partnership with a psychiatrist (Cate Blanchett) who's as manipulative as he is, and that alliance leads Stan on an extremely dangerous journey, from which it will be very hard for him to turn back.)



Bom, nem preciso dizer que é claro que eu estava muito animado para ver “O Beco do Pesadelo”. Em primeiro lugar, a obra seria o novo filme do cineasta mexicano Guillermo del Toro, responsável por filmes maravilhosos de fantasia sombria, como o vencedor de 3 Oscars “O Labirinto do Fauno” e o vencedor do Oscar de Melhor Filme “A Forma da Água”, os quais são alguns dos meus filmes favoritos do gênero. Em segundo lugar, seria o primeiro filme do diretor a não ter algum aspecto fantástico, o que permitiria que del Toro saísse um pouco do gênero que o consagrou aos olhos do público, e isso me deixou especialmente curioso.

Em terceiro lugar, “O Beco do Pesadelo” contaria com um elenco extremamente talentoso, liderado por nomes como Bradley Cooper, Cate Blanchett, Rooney Mara e Willem Dafoe, todos eles já reconhecidos aos olhos da Academia como atores muito competentes, sendo indicados ou até vencendo (no caso de Blanchett) uma das desejadas estatuetas douradas. Em quarto lugar, seria baseado no romance “O Beco das Ilusões Perdidas”, de William Lindsay Gresham, o qual já havia dado origem à uma adaptação cinematográfica, intitulada “O Beco das Almas Perdidas” e lançada em 1947. O longa comandado por Edmund Goulding é considerado um dos exemplos mais aclamados do subgênero noir, vertente do gênero de suspense, conhecida por retratar dramas sobre crimes, povoados por personagens moralmente cínicos e duvidosos.

Então, sim, minhas expectativas estavam consideravelmente altas para assistir ao novo filme de Guillermo del Toro, e, depois de esperar quase 2 anos por ele, finalmente tive a chance de ver “O Beco do Pesadelo” nos cinemas, e fico muito feliz em dizer que é o melhor filme do diretor desde “O Labirinto do Fauno”. Mesmo não tendo nenhum aspecto fantástico, del Toro consegue imprimir perfeitamente suas assinaturas narrativas e estéticas no seu filme mais realista até o momento, e isso colaborou para que a adaptação de 2021 do romance de Gresham se tornasse o meu favorito na presente temporada de premiações.

Ok, com isso dito, vamos falar sobre o roteiro. Adaptado pelo próprio Guillermo del Toro e por Kim Morgan, o primeiro destaque que gostaria de fazer em relação à narrativa é o seu passo, que é um pouco mais lento do que o de costume. Del Toro e Morgan constroem um suspense slow-burn (“que se queima lentamente”, em tradução livre) de primeira qualidade ao longo das extensas 2 horas e 30 minutos de “O Beco do Pesadelo”, dando ao espectador bastante tempo para se familiarizar com os personagens e o ambiente ao redor deles. Pode ser que, para alguns, o filme demore um pouco para “engatar”, mas, pelo menos, para mim, os roteiristas não desperdiçaram um segundo construindo este universo fictício para nós, fazendo com que cada momento que passemos com essas pessoas valha a pena.

O segundo destaque que gostaria de fazer no roteiro diz respeito à abordagem mais realista do diretor em relação ao enredo do filme. Não há absolutamente NADA remotamente fantasioso na narrativa adaptada por del Toro e Morgan, colaborando para que a adaptação do romance de Gresham alcance níveis máximos de humanidade, tensão e impacto. Inclusive, alguns momentos-chave ao longo das 2h30min de projeção me pegaram de surpresa, já que o diretor não recicla aqui a mesma estrutura narrativa de seus dois filmes mais famosos (“O Labirinto do Fauno” e “A Forma da Água”). Essa escolha criativa de uma abordagem mais realista permite que del Toro conduza uma história que se encontra fora de sua zona de conforto, como uma prova concreta de sua versatilidade como cineasta, o que é muito bom.

Mas (e é aqui que as coisas ficam interessantes), mesmo com a atmosfera e a vibe em geral de “O Beco do Pesadelo” sendo territórios desconhecidos para o diretor, a obra em questão consegue ser, com enorme sucesso, um filme legítimo de Guillermo del Toro, porque, mesmo sem nenhum aspecto fantasioso, a mensagem continua sendo a mesma dos filmes anteriores do cineasta. Tal mensagem seria: “Mesmo com monstros e criaturas fantásticas ameaçadoras, não há nada mais perverso do que o próprio ser humano”. Isso se aplica à tanto “O Labirinto do Fauno” quanto “A Forma da Água”, com suas criaturas fantásticas (um sapo gigante, um fauno e um homem-anfíbio) e os verdadeiros antagonistas, seres humanos sádicos e cínicos (Capitão Vidal e Coronel Strickland).

Falando em “seres humanos”, vamos ao terceiro destaque do roteiro: os personagens. Del Toro e Morgan fazem um admirável trabalho ao transformarem cada uma destas pessoas em alguém moralmente duvidoso, corruptível e deliciosamente misterioso. Os personagens que povoam a narrativa de “O Beco do Pesadelo” são os protagonistas mais humanos, crus e falhos retratados em um filme do diretor até o momento. Algo que reforça esse fato é a escolha do cineasta de não transformar os personagens em exemplos de pureza e heroísmo, idealizando-os para ganhar a simpatia do espectador. Pelo contrário, os roteiristas retratam os protagonistas sob uma luz especialmente trágica, distorcida e amarga, causando até uma espécie de aversão a eles no espectador, pelos atos manipulativos cometidos por eles ao longo da trama.

Outro detalhe que gostaria de apontar em relação ao roteiro diz respeito ao desenvolvimento do protagonista, interpretado pelo Bradley Cooper. Desde a cena inicial, os roteiristas deixam claro que Stanton Carlisle não é flor que se cheire. Mas o fato de Carlisle fazer coisas perversas ao longo da trama não o impede de ser absolutamente fascinante. Del Toro e Morgan fazem um trabalho excelente de ir lentamente desconstruindo a personalidade do personagem, especialmente pelo contraste entre as dinâmicas dele com as duas protagonistas femininas, interpretadas pela Cate Blanchett e Rooney Mara (que já atuaram juntas em “Carol”, de 2015). Os roteiristas conseguem equilibrar perfeitamente o charme e o carisma inerentes ao personagem com um caráter mais manipulativo e aproveitador, sempre deixando um vislumbre de mistério em suas feições, e essa mistura acaba por manter a atenção do espectador, o que é excelente.

Outro destaque, para mim, seriam os temas predominantes da narrativa, os quais perduram até hoje, imprimindo uma espécie de atemporalidade ao longa-metragem de del Toro e permitindo que “O Beco do Pesadelo” funcione como um conto moralista relevante e afiadíssimo. Temas como manipulação, enganação, traição e corrupção, especialmente na época povoada por fake news em que vivemos, permitem que o filme compartilhe a mesma atmosfera realista, suja, humana e sombria presente em filmes como “Taxi Driver”, “Coringa” e “Parasita”. Assim como os exemplos citados, a nova obra de del Toro consegue incomodar o espectador através de razões concretas e verdadeiras, especialmente por fazer-nos pensar que os eventos retratados na tela poderiam tranquilamente acontecer na vida real.

Um último aspecto que gostaria de ressaltar em relação ao roteiro diz respeito ao final do filme. Não se preocupem, não vou colocar nenhum spoiler aqui, mas posso dizer que del Toro e Morgan conseguem desenvolver de forma excepcional o arco narrativo do protagonista, do início ao derradeiro ato final. A jornada que Carlisle percorre ao longo da trama é escrita de forma tão perfeita, que acaba culminando em um dos melhores finais que eu vi em um filme nesses últimos tempos. A conclusão do arco do personagem de Cooper acaba sendo um exemplo excelente do que eu gostaria de chamar de “justiça poética”, sendo ainda mais impactante pelo fato dela se contrastar quase que completamente com as condições dele no início da trama.

Resumindo, o roteiro de “O Beco do Pesadelo” consegue funcionar, ao mesmo tempo, como um suspense psicológico extremamente eficiente e como um conto moralista atemporal, graças aos seus personagens moralmente duvidosos, à atmosfera noir cheia de tensão e ao passo mais lento da narrativa, permitindo, assim, que o cineasta Guillermo del Toro saia de sua zona de conforto repleta de fantasia e prove sua flexibilidade e versatilidade como diretor de histórias mais realistas, pé-no-chão e, especialmente, humanas. Bravo, Guillermo del Toro!

(Well, I don't even have to say that I was really excited to watch “Nightmare Alley”. Firstly, it would be the new film by Mexican director Guillermo del Toro, who is responsible for making wonderful dark fantasy films, such as the 3-Oscar-winning film “Pan's Labyrinth” and Best Picture winner “The Shape of Water”, which are some of my favorite films in the genre. Secondly, it would be the director's first film without any type of fantasy aspect to it, which would allow del Toro to step out of the genre that cemented him in the eyes of the audience, and that left me especially curious to check it out.

Thirdly, “Nightmare Alley” would count on the help of an extremely talented cast, led by names like Bradley Cooper, Cate Blanchett, Rooney Mara and Willem Dafoe, all of which were recognized by the Academy as very competent performers, being nominated or even winning (in Blanchett's case) one of the coveted golden statuettes. In fourth place, it would be an adaptation of the novel of the same name, written by William Lindsay Gresham, which had already been adapted to the big screen, in 1947, through a film eponymously titled after the novel. The Edmund Goulding-directed film became one of the most acclaimed examples of the film noir subgenre, a ramification of the thriller genre, which focuses on crime dramas, populated by morally cynical and doubtful people.

So, yes, my expectations were considerably high to watch Guillermo del Toro's latest film, and, after almost 2 years of waiting for it, I finally got the chance to watch “Nightmare Alley” on the big screen, and I'm really happy to say that it's the director's best film since “Pan's Labyrinth”. Even though it doesn't have any fantasy aspects to it, del Toro manages to successfully imprint his narrative and aesthetic signatures to his most realistic film to date, and that allowed the 2021 adaptation of Gresham's novel to become my favorite film in this year's award season, which is already in motion.

Okay, with that said, let's talk about the screenplay. Adapted by Guillermo del Toro himself and Kim Morgan, the first highlight I'd like to make in regards to the narrative is its pacing, which is slower than what we've come to expect. Del Toro and Morgan manage to build a top-tier slow-burn of a thriller throughout “Nightmare Alley”'s sweeping runtime of 2 hours and 30 minutes, giving the viewer plenty of time to be familiarized with the characters and the environment that surrounds them. It can be likely that, to some, it may take a long time to go straight to the point, but, at least, for me, the screenwriters didn't waste a single second while building this fictional universe for us, transforming every moment we spend with these characters into one that's worth our while.

The second highlight I'd like to make about the screenplay is the director's more realistic approach towards the film's plot. There isn't absolutely ANYTHING even remotely fantasy-like in the narrative adapted by del Toro and Morgan, so that the adaptation of Gresham's novel could be able to reach maximum levels of humanity, tension and impact. As a matter of fact, some key moments throughout the film's 2h30min runtime caught me by surprise, as the director doesn't recycle the narrative structure of his most famous films here (“Pan's Labyrinth” and “The Shape of Water”). That creative choice of a more realistic approach allows del Toro to lead a story that's located outside his comfort zone, as concrete proof of his versatility as a filmmaker, which is really good.

But (and this is where things get really interesting), even with the atmosphere and general vibe of “Nightmare Alley” being uncharted territory for the director, his work reviewed here manages to be, with astounding success, a legitimate Guillermo del Toro film, because even without the fantasy aspects, the overall message of the film remains the same as the one in his previous works. That message would be: “Even with these threatening, fantastical monsters and creatures, there isn't anything more evil and wicked than the human being”. That applies to both “Pan's Labyrinth” and “Shape of Water”, with their fantastical creatures (a giant frog, a faun, and an amphibian man) and its true antagonists, sadistic and cynical human beings (Captain Vidal and Col. Strickland).

Speaking of “human beings”, let's head into the script's third highlight: the character development. Del Toro and Morgan do an admirable job of turning each and every one of these people into someone that's morally ambiguous, corruptible and delightfully mysterious. The characters that populate the plot of “Nightmare Alley” are the most human, raw and flawed people to ever be in a del Toro film to date. One thing that reinforces that fact is the filmmaker's choice of not painting them as examples of perfection and heroism, idealizing them to gain the viewer's sympathy. On the contrary, the screenwriters choose to portray the protagonists under an especially tragic, twisted and bitter light, to the point of triggering the viewer with some sort of aversion towards these characters, because of the manipulative acts they get themselves into throughout the plot.

Another detail I'd like to point out about the screenplay is the development of the main character, played by Bradley Cooper. Since the film's opening scene, the screenwriters make it clear that Stanton Carlisle isn't a role model for viewers to look up to. But the fact that Carlisle does awful things to people throughout the plot doesn't stop him from being absolutely fascinating. Del Toro and Morgan do an excellent job in slowly deconstructing the character's personality, especially through the contrast between his dynamics with the two female protagonists, portrayed by Cate Blanchett and Rooney Mara (who shared the screen in 2015's “Carol”). The screenwriters manage to perfectly balance the character's inherent charm and charisma with a more manipulative, greedy attitude, while always leaving a hint of mystery in his features, and that mixture ends up keeping the viewer's attention, which is excellent.

Another highlight, for me, would be the narrative's predominant themes, which live on to today's times, imprinting some sort of timelessness to del Toro's film and allowing “Nightmare Alley” to work as a razor-sharp, relevant cautionary tale. Themes such as manipulation, deception, betrayal and corruption, especially in the fake news-filled times we're living in right now, allow the film to share the same realistic, dirty, human and dark atmosphere that was present in films like “Taxi Driver”, “Joker” and “Parasite”. Just like the aforementioned examples, del Toro's latest film manages to make the viewer feel uncomfortable through concrete and true reasons, especially as it makes us wonder that the events portrayed onscreen could easily happen in real life.

One last aspect I'd like to reinforce about the screenplay is directed towards the film's ending. Don't worry, I won't put any spoilers here, but I can say that del Toro and Morgan manage to develop the protagonist's narrative arc in a wonderful way, from the beginning to the very last minute of the final act. The journey that Carlisle goes through throughout the plot is written in such a perfect way, that it ends up culminating in one of the best ending scenes I've seen in a movie recently. The conclusion of Cooper's character arc ends up being an excellent example of what I like to call “poetic justice”, which becomes all the more impactful for almost completely contrasting with the character's conditions in the beginning of the plot.

To sum it up, the screenplay for “Nightmare Alley” manages to work, simultaneously, as a top-tier, effective psychological thriller and as a timeless cautionary tale, thanks to its stellar cast of morally ambiguous characters, its tension-filled noir atmosphere and the narrative's slower pacing, therefore, allowing filmmaker Guillermo del Toro to step out of his fantasy-filled comfort zone and prove his flexibility and versatility as a director of more realistic, down-to-earth and, especially, human stories. Bravo, Guillermo del Toro!)



Como dito anteriormente, o elenco de “O Beco do Pesadelo” tem tanto talento que chega até a dar inveja. Cada ator aqui entrega uma ótima performance e deixa sua marca na mente do espectador, mesmo que alguns personagens tenham mais tempo de tela que outros. Começando pelo Bradley Cooper, que encontra aqui seu melhor papel desde seu trabalho indicado ao Oscar em “Nasce uma Estrela”. Há muito carisma e charme envolvidos no desempenho do ator, que consegue transitar perfeitamente entre uma atitude mais ingênua e amigável e outra mais fria e manipuladora. Cooper consegue lidar com a desconstrução de seu personagem de uma maneira gradual e fluida, lentamente e cuidadosamente levantando o véu de mistério usado por ele ao longo da trama. Essa transição entre as várias facetas do protagonista é o verdadeiro destaque do trabalho do ator aqui, e há uma cena perto da conclusão do filme que justifica com primor uma provável indicação ao Oscar de Melhor Ator.

Eu amei como as protagonistas femininas foram trabalhadas na trama, já que o protagonista é desenvolvido especialmente através das dinâmicas contrastantes dele com estas personagens. De um lado, temos a Rooney Mara, que interpreta a personagem mais ingênua e pura da trama, e eu gostei bastante de como ela usa a doçura e o amor da personagem dela pelo protagonista para mantê-lo com os pés no chão. Esta “perfeição de espírito” presente na personagem de Mara é o que faz o trabalho da atriz ser convincente, e acaba por fazer o espectador desejar que nada de ruim aconteça com ela ao longo da trama. De outro, temos a Cate Blanchett, que interpreta aqui a femme fatale perfeita. Sedutora, misteriosa, convincente, hipnotizante, manipuladora, ameaçadora e levemente assustadora. Todas estas qualidades que definem uma boa femme fatale estão presentes na performance de Blanchett, que poderia muito bem ser indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante este ano.

Nos papéis de mentores do protagonista, temos performances menores, mas ainda memoráveis de Willem Dafoe, Toni Collette e David Strathairn. Dafoe rouba a cena como o mestre do picadeiro do circo itinerante, e é responsável pela maior parte da exposição narrativa do filme. É um papel que, em teoria, seria meio maçante de ver, mas a personalidade ambígua e ameaçadora do personagem de Dafoe faz com que suas cenas sejam algumas das melhores do filme. A Toni Collette interpreta a “vidente” do circo, e nós, como espectadores, vemos todo o planejamento que garante um bom resultado dessa “clarividência”, diferente do público do circo. A atriz consegue entregar uma performance extremamente convincente, que não entrega os truques por trás das cortinas, o que é muito bom. O David Strathairn interpreta um dos personagens mais melancólicos da trama, de modo que é impossível não sentir pena dele. Ele possui uma boa dinâmica com Cooper, e consegue deixar sua marca, mesmo com menos tempo de tela.

E, para finalizar, temos os personagens mais ameaçadores da trama, interpretados pelo Richard Jenkins e pelo Ron Perlman. Jenkins interpreta aqui um personagem bem diferente do Giles de “A Forma da Água”, obra anterior de del Toro. Ao invés da faceta amigável, apaixonante e bondosa do melhor amigo da protagonista do filme de 2017, somos apresentados à uma pessoa amarga, tomada pela culpa, e quase que completamente indecifrável para tanto o protagonista quanto o espectador. Jenkins faz um trabalho primoroso em ressaltar o caráter misterioso de seu personagem, o que acaba aumentando o nível de riscos presente na relação dele com o protagonista de Cooper. Eu esperava um pouco mais do personagem do Ron Perlman, para falar a verdade, especialmente perto da conclusão, sendo que ele compartilha uma dinâmica bem cativante e protetora com a personagem da Rooney Mara. Mesmo com muito pouco tempo de tela, ele consegue replicar as atitudes ameaçadoras e brutas que marcaram sua interpretação como Hellboy, o que eu achei bem legal.

(As previously said, the cast of “Nightmare Alley” has so much talent stored in one place, it's almost unfair. Each actor here delivers a great performance and leaves their mark on the viewer's mind, even if some characters have more screen time than others. Starting with Bradley Cooper, who finds his best role here since his Oscar-nominated turn in 2018's “A Star is Born”. There's a lot of charisma and charm involved in the actor's development, and he manages to perfectly travel inbetween a more naïve and friendly attitude and a colder, more manipulative one. Cooper excels in dealing with his character's deconstruction in a fluid and gradual way, slowly and carefully lifting the veil of mystery he uses throughout the plot. This transition between the protagonist's several “faces” is the real highlight of the actor's work here, and there's one scene near the film's conclusion that more than justifies a likely Oscar nomination for Best Actor.

I loved how the female protagonists were worked with throughout the plot, as the main character is mainly developed through his contrasting dynamics with these characters. On one hand, we have Rooney Mara, who plays the most innocent, pure character in the plot, and I really liked how she used her character's sweetness and love for the protagonist to keep his feet stuck to the ground. This “perfection of spirit” in Mara's character is what makes the actress's work convincing for the viewer, and that ends up making us hope that nothing bad happens to her throughout the plot. On the other hand, we have Cate Blanchett, who plays the perfect femme fatale here. Seductive, mysterious, convincing, hypnotizing, manipulative, threatening and slightly frightening. All these qualities that define a good femme fatale are present in Blanchett's performance, which might as well earn her a nomination for Best Supporting Actress at this year's Oscars.

In the roles of the protagonist's mentors, we have smaller, but memorable performances by Willem Dafoe, Toni Collette and David Strathairn. Dafoe steals the scene as the traveling carnival's ringmaster, and is responsible for most of the film's narrative exposition. It's a role that, in theory, would be very tiring for the viewer to sit through, but the ambiguous and threatening personality of Dafoe's character makes his scenes some of the best ones in the film. Toni Collette plays the carnival's “clairvoyant”, and we, as viewers, manage to see the entire plan that guarantees a good result of that “clairvoyance”, unlike the carnival's audience. The actress manages to deliver an extremely convincing performance, which doesn't give away the tricks hiding behind the curtains, and that's really good. David Strathairn plays one of the plot's most melancholic characters, in a way that's impossible for you not to feel sorry for him. He has a good dynamic with Cooper, and manages to leave his mark, even with less screen time.

And, finally, we have the most threatening characters in the plot, played by Richard Jenkins and Ron Perlman. Jenkins gets to play, here, a much different role than Giles from “The Shape of Water”, del Toro's previous work. Instead of the friendly, passionate, and kind attitudes of the protagonist's best friend in the 2017 film, we are presented with a bitter, guilt-stricken and almost completely indecipherable person, to both the protagonist and the viewer. Jenkins does an outstanding work in reinforcing the character's mysterious background, which manages to enhance the level of stakes present in his relationship with Cooper's protagonist. I was hoping to see a little bit more of Ron Perlman's character, as a matter of fact, especially near the conclusion, as he shares a captivating, protective dynamic towards Rooney Mara's character. Even with very little screen time, he manages to replicate the threatening, brute attitudes that marked his portrayal as Hellboy, which I thought it was quite nice.)



E, por fim, temos os aspectos técnicos, que aproximam “O Beco do Pesadelo” de duas estéticas bem específicas: a de um filme noir e a de um filme de Guillermo del Toro. Primeiramente, temos um trabalho extraordinário de direção de fotografia e montagem, executados, respectivamente, por Dan Laustsen e Cam McLauchlin. Um destaque que gostaria de fazer em relação ao trabalho de Laustsen (que já trabalhou com del Toro em “A Forma da Água”) é a iluminação, a qual é perfeita para combinar com a atmosfera proposta de um filme noir. Há certas cenas que me despertaram bastante a curiosidade de ver “O Beco do Pesadelo” em preto e branco (o que já aconteceu nos EUA, então, Disney, pelo amor de Deus, traz essa versão pra cá também!). Alguns momentos me lembraram bastante do visual de “A Forma da Água”, e, como eu amei esse filme, eu achei bem interessante. É um filme visualmente sombrio e “sujo”, o que acaba funcionando com a vibe mais realista que del Toro escolheu para seu novo trabalho.

Eu gostei bastante da montagem de McLauchlin em dois aspectos: nos flashbacks, que são rápidos o suficiente para nos fazer pensar que aquilo realmente assombra o protagonista; e nas transições entre os três atos do filme, feitas com um “iris fade out” (um método de montagem que normalmente sinalizava o final de um filme bem antigo, onde a tela vai reduzindo seu tamanho em forma de círculo até ficar completamente escura. Este método também está presente no início e final de “La La Land”, de Damien Chazelle, que, assim como “O Beco do Pesadelo”, é uma homenagem e revitalização de um gênero pouco presente na consciência coletiva do público).

A direção de arte, assim como em “A Forma da Água”, é uma obra-prima à parte. Há duas identidades visuais em particular que me chamaram a atenção: na primeira metade do filme, primordialmente ambientada no circo, vários aspectos me lembraram de uma mistura bem feita entre os filmes mais adultos do Tim Burton e uma versão perturbadora, realista e distorcida de “O Rei do Show”, o que eu achei bem interessante; e na segunda metade, o glamour e o estilo da Nova York dos anos 1940 retratada aqui me fez lembrar muito do que eu visualizava ao ler “O Grande Gatsby”, romance clássico de F. Scott Fitzgerald, que encanta por sua nostalgia direcionada à Idade do Jazz, na década de 1920. Gostei bastante do contraste entre o sombrio e o estiloso, e acho que o trabalho extraordinário feito aqui deveria ser um dos principais indicados ao Oscar de Melhor Direção de Arte.

Eu quase não destaco o trabalho de edição e mixagem de som nos filmes, somente naqueles onde o som (ou a ausência dele) é uma peça central na narrativa, mas há um ótimo trabalho de som aqui. Eu, particularmente, gostei bastante dos detalhes nos pequenos sons, como o tilintar de um copo de vidro ou o tique-taque de um relógio de pulso. Outro destaque do trabalho de som é o uso extremamente calculista do silêncio, que acaba por aumentar exponencialmente a tensão presente na atmosfera e naquela cena em particular. E, por fim, temos a trilha sonora original do Nathan Johnson, que me lembrou muito do trabalho vencedor do Oscar do Alexandre Desplat em “A Forma da Água”. As faixas de Johnson são essencialmente atmosféricas e misteriosas, lideradas por orquestras e pianos gradualmente crescentes, o que acaba por combinar perfeitamente com a vibe noir que o filme deseja exalar.

(And, at last, we have the technical aspects, which bring “Nightmare Alley” closer to two very specific aesthetics: that of a film noir and that of a Guillermo del Toro film. Firstly, we have an extraordinary job in cinematography and editing, executed, respectively, by Dan Laustsen and Cam McLauchlin. One highlight I'd like to make regarding Laustsen's work (as he had already worked with del Toro in “The Shape of Water”) is the lighting, which is simply pitch-perfect and fits wonderfully with the proposed atmosphere of a film noir. There are certain scenes that greatly enhanced my curiosity to see “Nightmare Alley” in black-and-white (we know you have this version, Disney, so, please, make it available in Brazil as well!). Some moments reminded me a lot of the visuals in “The Shape of Water”, and, as I adored that film, I thought it was quite interesting. It's a visually dark and “dirty” film, which ends up matching the more realistic vibe that del Toro chose for his latest work.

I really enjoyed McLauchlin's editing in two particular aspects: in the flashback sequences, which are quick enough to make us think that those events actually haunt the protagonist; and in the transitions between the film's three acts, which were done using an “iris fade out” (an editing technique generally used in order to signal at the ending of a film made in the Golden Age of Hollywood, where the screen grows smaller in the form of a circle until it goes completely dark. This technique is also present in the beginning and ending of Damien Chazelle's “La La Land”, which, like “Nightmare Alley”, is an homage and revival of a genre that's less present in the viewers' collective consciousness).

The production design, just like in “The Shape of Water”, is a masterpiece by itself. There are two particular visual identities that caught my attention: in the film's first half, which is set mostly at the carnival, several aspects reminded me of a well-done mixture between Tim Burton's more mature films and a disturbing, realistic, twisted version of “The Greatest Showman”, which I found really interesting; in the film's second half, the glamour and style of 1940s New York City, as it is portrayed here, reminded me a lot of what I visualized in my mind while I was reading F. Scott Fitzgerald's classic novel “The Great Gatsby”, which enchants us through its nostalgia for the Jazz Age, in the 1920s. I really enjoyed this contrast between the dark and the stylish, and I think that the extraordinary work displayed here should be one of the main nominees for the Oscar for Best Production Design.

I almost don't talk about the sound editing and mixing work in films, only in those where sound (or its absence) play a main part in the film's plot, but there is a great work involving sound here. I, particularly, really enjoyed the details in the little sounds, such as the clinking of a glass of whisky or the ticking of a wrist watch. Another highlight of the sound work is the extremely precise use of silence, which ends up exponencially enhancing the level of tension in the atmosphere and in that particular scene. And, at last, but not least, we have the film's original score, composed by Nathan Johnson, which reminded me a lot of Alexandre Desplat's Oscar-winning work in “The Shape of Water”. Johnson's tracks are essentially atmospheric and mysterious, led by gradually crescent orchestras and grand pianos, which ends up perfectly fitting the noir vibe the film wishes to convey.)



Resumindo, “O Beco do Pesadelo” é mais uma prova da completa genialidade de Guillermo del Toro como diretor. Saindo com sucesso da zona de conforto, o cineasta mexicano se mostra extremamente versátil ao contar sua história mais realista até o momento, sendo auxiliado por um elenco imensamente talentoso, aspectos técnicos que remetem de forma perfeita ao gênero noir e um roteiro que prioriza a tensão e a humanidade de seus personagens acima de qualquer outra coisa. Assistam na maior tela possível, se puderem, porque realmente vale a pena.

Nota: 10 de 10!!

É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,

João Pedro

(In a nutshell, “Nightmare Alley” is further proof of Guillermo del Toro's complete genius as a master filmmaker. Successfully outside his comfort zone, the Mexican filmmaker shows himself as extremely versatile when telling his most realistic story to date, relying on the help of an immensely talented cast, technical aspects that make it a perfect throwback to the film noir genre and a screenplay that prioritizes tension and its characters' humanity above everything else. Watch it in the biggest screen you can find, if you're able, because it'll be really worth your while.

I give it a 10 out of 10!!

That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,

João Pedro)


sábado, 15 de janeiro de 2022

"Pânico" (2022): o melhor filme da franquia desde o original (Bilíngue)

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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para falar sobre um dos filmes mais aguardados de 2022 para mim, o qual já está em exibição nos cinemas! Atualizando e intensificando com sucesso a metalinguagem, o humor autorreferente e a violência que marcaram a obra original, o filme em questão consegue ser, ao mesmo tempo, a melhor sequência de uma das franquias de terror mais icônicas de todos os tempos, e uma bela homenagem ao legado criado pelo falecido gênio que foi Wes Craven. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “Pânico”. Vamos lá!

(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to talk about one of 2022's most anticipated films for me, which is now playing on theaters! While successfully updating and intensifying the metalanguage, self-referential humor and violence that marked the original work, the film I'm about to review manages to be, at the same time, the best sequel in one of the most iconic horror franchises of all time, and a beautiful homage to the legacy created by the late genius that was Wes Craven. So, without further ado, let's talk about “Scream”. Let's go!)



25 anos após uma onda de assassinatos brutais aterrorizarem a cidadezinha pacata de Woodsboro, o filme acompanha Sam Carpenter (Melissa Barrera), uma jovem que se vê forçada a retornar à sua cidade natal e enfrentar seu passado sombrio, após sua irmã, Tara (Jenna Ortega), ter sido brutalmente atacada por uma pessoa usando o disfarce de Ghostface. Juntamente com Sidney Prescott (Neve Campbell), Gale Weathers (Courteney Cox) e Dewey Riley (David Arquette), Sam embarca em uma jornada perigosa para descobrir quem é o assassino, antes que mais pessoas sofram um terrível destino.

(25 years after a wave of brutal murders terrified the quiet town of Woodsboro, the film follows Sam Carpenter (Melissa Barrera), a young woman who sees herself being forced to return to her hometown and face her dark past, after her sister Tara (Jenna Ortega) is brutally attacked by a person wearing a Ghostface costume. Alongside Sidney Prescott (Neve Campbell), Gale Weathers (Courteney Cox) and Dewey Riley (David Arquette), Sam embarks on a dangerous journey to find out who the killer is, in order to prevent more people from suffering a terrible fate.)



Ok, para aqueles que ainda não sabem, eu sou um enorme fã da franquia “Pânico”. Inclusive, no início do ano passado, fiz um ranking dos quatro filmes lançados antes deste novo capítulo, em comemoração aos 25 anos da icônica obra original (você pode ler essa postagem aqui). E, assim como acontece com basicamente toda franquia que é resgatada por um novo elenco e uma nova equipe técnica, haviam muitas dúvidas sobre se um novo filme daria certo ou não, especialmente em respeito às pessoas atuando por trás da câmera.

Primeiramente, e o mais importante, este novo capítulo seria o primeiro que não seria dirigido pelo Wes Craven, já que, infelizmente, o diretor responsável pelo “A Hora do Pesadelo” original e pelos quatro filmes anteriores de “Pânico” faleceu em 2015, em decorrência de um tumor cerebral. Em segundo lugar, o filme não teria seu roteiro escrito pelo criador da franquia, Kevin Williamson (algo que já aconteceu em “Pânico 3”, o qual é considerado o mais fraco dos quatro filmes lançados). E, em terceiro lugar, o retorno dos atores originais da franquia, como Neve Campbell, Courteney Cox e David Arquette ainda não era uma certeza na época do anúncio do filme.

Felizmente, estas dúvidas foram se transformando em certezas surpreendentes com o passar do tempo. Em primeiro lugar, foi anunciado que a dupla de diretores Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett, responsável pelo excelente e subversivo “Casamento Sangrento”, de 2019, iria comandar o novo filme, que contaria com a produção executiva de Williamson, roteirista do filme original. Além disso, Guy Busick, um dos roteiristas do filme anterior de Bettinelli-Olpin e Gillett, também iria retornar para este novo capítulo na saga “Pânico”. Um elenco bem diversificado de jovens promissores foi sendo gradualmente escalado, e as dúvidas dos fãs desapareceram quase que completamente com o anúncio do retorno de Campbell, Cox e Arquette em seus papéis originais.

Eu, particularmente, estava MUITO animado para ver este novo “Pânico”, não só pelo fato de que Sidney, Gale e Dewey iriam retornar, mas especialmente por ter adorado “Casamento Sangrento” e admirado a proficiência e o sigilo dos diretores ao desenvolver o novo capítulo da franquia. Para quem não sabe, o filme fora filmado inteiramente durante a pandemia de COVID-19, e diferentes versões do roteiro foram escritas e filmadas, para evitar que o verdadeiro final da sequência seja “vazado” para o público (algo que já aconteceu no passado da franquia, com “Pânico 2” sendo o primeiro filme a ter seu desenvolvimento profundamente afetado por um vazamento). E além disso, a sequência completou sua pós-produção em junho de 2021, 7 meses antes do lançamento proposto.

Então, com expectativas altíssimas, que aumentaram ainda mais com as primeiras reações positivas ao longa, fui assistir ao filme ontem, e devo dizer que fiquei extremamente impressionado com a qualidade, a paixão e o cuidado que foi posto neste novo capítulo na franquia “Pânico”. Me atrevo a dizer que fiquei chocado até, algo que não aconteceu comigo numa sala de cinema por muito tempo. Me atrevo ainda mais a dizer que nem as melhores cenas de “Homem-Aranha: Sem Volta para Casa” me deixaram tão boquiaberto e arrepiado quanto algumas cenas nesta sequência.

Ok, com isso dito, vamos falar sobre o roteiro. Os roteiristas Guy Busick e James Vanderbilt conseguem fazer duas coisas ao mesmo tempo aqui, de forma primorosa: atualizar e amplificar todas as qualidades que marcaram o roteiro de Williamson no filme original, como a metalinguagem, o humor autorreferente e a violência; e replicar a manipulação das emoções do espectador originada no primeiro “Pânico”, nos surpreendendo e chocando da melhor maneira possível com o desenrolar da narrativa, e servindo como uma bela homenagem ao legado que Wes Craven ajudou a criar com a obra original.

A primeira qualidade que gostaria de destacar sobre o roteiro é que, assim como seu assassino icônico, a narrativa de Busick e Vanderbilt é maravilhosamente imprevisível, de modo que os roteiristas frequentemente brincam com as expectativas e previsões do espectador, e este “jogo” que acontece entre nós e os roteiristas é uma das melhores qualidades da franquia como um todo. Nós suspeitamos de várias pessoas durante o filme inteiro, pelas mais variadas razões, e na grande maioria das vezes, Busick e Vanderbilt deixam pequenos detalhes que fundamentam essas suspeitas, só para desmenti-las da maneira mais surpreendente e chocante possível no decorrer da trama, o que é simplesmente incrível.

Em segundo lugar, gostaria de destacar o quão bem escritos são os novos personagens, e o quão bem eles combinam com os arquétipos dos personagens adolescentes do filme original. Temos a protagonista (ou final girl), o interesse amoroso, o bad boy, o alívio cômico, a scream queen (ou “rainha dos gritos”), a cinéfila, o casal de jovens populares, o parente da policial local, entre outros, e a coisa mais impressionante que Busick e Vanderbilt conseguem fazer é conectar estes novos personagens ao legado dos filmes anteriores, relacionando-os à personagens apresentados nos outros 4 filmes. Gostei de como a apresentação dos personagens funciona tanto como um exercício nostálgico quanto como uma maneira de introduzir este universo para uma nova geração de espectadores.

Em terceiro lugar, eu gostaria de destacar a tensão e a violência presentes ao longo do filme. Há uma sequência em particular onde há um uso primoroso de fotografia, montagem, design de som e trilha sonora para fazer com que o espectador fique sempre inquieto em seu assento, e funciona. Há também presente, nesta mesma sequência, uma desconstrução brilhante desta tensão, que consegue servir como um alívio cômico, e eu achei isso bem interessante. Posso dizer com tranquilidade que “Pânico” (ou “Pânico 5”, para não confundir com o original) é o filme mais violento da franquia até agora, contando com mortes inventivas, sangrentas e brutais que, particularmente, me deixaram boquiaberto.

Em quarto lugar, gostaria de destacar o senso de humor autorreferente, que já é marca registrada da franquia desde o filme original. Eu gostei de como ele sempre foi sendo atualizado para combinar com o estado e a situação da cultura pop e dos fãs na época de lançamento destes filmes. O primeiro teve seu senso de humor construído a partir da revitalização do gênero slasher e a subversão de seus clichês; o segundo, a partir da discussão que sequências são melhores que filmes originais; o terceiro, a partir do aumento no número de riscos no último filme de uma trilogia, de modo que ninguém está seguro; o quarto, a partir da ideia recorrente de remakes e vídeos virais.

E agora, o quinto filme lida com vários aspectos relevantes na cultura pop de hoje em dia: a revitalização de franquias antigas através de “sequências-legado” (por exemplo, o que aconteceu com “Star Wars: O Despertar da Força” e com “Ghostbusters: Mais Além”, onde é contada uma história relativamente nova, mas que são incluídos vários aspectos que inserem o filme dentro de uma cronologia já estabelecida); a natureza tóxica e, muitas vezes, extrema de certas comunidades de fãs; o desprezo destes fãs em relação à constante falta de ideias de Hollywood, que muitas vezes leva os estúdios a reinventarem filmes icônicos sob uma lente extremamente bizarra; o duelo onipresente entre terror mainstream (“Jogos Mortais”, “Invocação do Mal”, e “Halloween”) e terror elevado (“O Babadook”, “Hereditário”, “Midsommar” e “A Bruxa”); entre muitos outros temas. Gostei bastante de como os roteiristas conseguiram atualizar os temas recorrentes da franquia para os dias atuais.

E em último lugar, temos as referências e easter eggs em respeito ao legado que foi criado e estabelecido ao longo destes 25 anos. Locações icônicas revisitadas; referências brilhantes, melancólicas e nostálgicas à personagens marcantes dos filmes anteriores, falecidos ou não; enquadramentos replicados de forma quase perfeita e extremamente fiel à cenas que foram executadas da mesma maneira em algum filme anterior, e em um contexto similar. Há duas sequências em particular que gostaria de destacar: a cena de abertura, a qual é a melhor e a mais tensa desde o original de 1996, com Drew Barrymore; e uma cena onde há uma festa, a qual pode ter um duplo sentido bem significativo e simbólico para fãs dos 4 filmes anteriores.

Ou seja, resumindo, o quinto filme da franquia “Pânico” é uma atualização brilhante das marcas registradas estabelecidas há 25 anos, contando com um elenco diversificado e bem desenvolvido de personagens novos, mortes inventivas e ultraviolentas, reviravoltas chocantes e surpreendentes, um senso de humor autorreferente atual e relevante para os dias de hoje e um punhado de referências aos quatro filmes anteriores, com o objetivo de criar uma belíssima homenagem ao verdadeiro mestre dos slashers que foi Wes Craven. Descanse em paz, Wes.

(Okay, for those who still don't know, I'm a massive fan of the “Scream” franchise. As a matter of fact, in early 2021, I wrote a ranking of the four films that had been released before this new chapter, in celebration of the iconic original work's 25th anniversary (you can read it right here). And, just like it happens with practically every franchise that's rebooted with a new cast and a new technical crew, there were a lot of doubts whether if a new film would work or not, especially when it came to the people behind the camera.

Firstly, and most importantly, this would be the first film not to be directed by Wes Craven, as, unfortunately, the director of the OG “A Nightmare on Elm Street” and the first four “Scream” films passed away in 2015, because of a brain tumor. Secondly, the film's screenplay would not be written by the franchise's creator, Kevin Williamson (something that already happened in “Scream 3”, which is widely considered to be the weakest film in the franchise). And, thirdly, the return of the franchise's original actors, such as Neve Campbell, Courteney Cox and David Arquette, wasn't a complete certainty at the time of the film's announcement.

Fortunately, these doubts slowly transformed into surprising certainties as time went by. Firstly, it was announced that directing duo Matt Bettinelli-Olpin and Tyler Gillett, responsible for the excellent and subversive “Ready or Not”, from 2019, would helm the new film, which would rely on the executive production of Williamson, who wrote the original film. Besides that, Guy Busick, one of the screenwriters responsible for Bettinelli-Olpin and Gillett's previous film, would also return for this new chapter in the “Scream” franchise. A very diversified cast of promising youngsters gradually took form, and fans' doubts disappeared almost completely with the announcement of Campbell, Cox and Arquette's return to their original roles.

I was, particularly, VERY excited to see this new “Scream” movie, not only because Sidney, Gale and Dewey would return, but also because I loved “Ready or Not” and admired the directors' proficiency and secrecy when developing this new chapter in the franchise. To those who don't know, the film was entirely filmed during the COVID-19 pandemic, and different versions of the screenplay were written and filmed in order to prevent the sequel's real ending from being revealed and leaked to the public (something that already happened in the franchise's past, with “Scream 2” being the first film to have its production deeply affected by a leak). And besides that, the sequel had completed post-production in June 2021, 7 months before its proposed release date.

So, with really high expectations, which became even higher due to the positive first reactions to the sequel, I watched the film yesterday, and I must say I was extremely impressed with the amount of quality, passion and care that was put into this new chapter in the “Scream” franchise. I dare to say I was even shocked, something that hasn't happened to be for a long time in a movie theater. I dare even further when I say that not even the best and most exhilarating scenes in “Spider-Man: No Way Home” left me as gobsmacked and thrilled as some scenes in this sequel. I mean, it's that level of good.

Okay, with that said, let's talk about the screenplay. Screenwriters Guy Busick and James Vanderbilt manage to do two things at the same time here, in a rather masterful way: they manage to update and amplify every quality that marked Williamson's screenplay in the original film, such as the metalanguage, the self-referential sense of humor and the gory violence; and replicate the manipulation of the viewer's emotions, established in the original “Scream”, surprising and shocking us in the best way possible with the narrative's unraveling, serving as a beautiful homage to the legacy Wes Craven helped creating with the original film.

The first quality I'd like to highlight about the screenplay is that, much like its iconic killer, Busick and Vanderbilt's narrative is wonderfully unpredictable, in a way that the screenwriters frequently play with the viewer's expectations and predictions, and this “game” that happens between us and the screenwriters is one of the best qualities in the franchise as a whole. We become suspicious of several people throughout the entirety of the film, and in the great majority of times, Busick and Vanderbilt leave small details that are fundamental to these suspicions, only for the writers to debunk them in the most spectacular and shocking way possible throughout the plot, which is simply amazing.

Secondly, I'd like to highlight how well-written these new characters are, and how well they end up fitting into the archetypes of the teenage characters in the original film. We have the protagonist (or final girl), the love interest, the bad boy, the comic relief, the scream queen, the film buff, the popular young couple, the one that's related to a local police officer, and so it goes, and the most impressive thing that Busick and Vanderbilt manage to do is that they connect these new characters to the legacy established in the previous films, relating them to characters introduced in the past 4 films. I enjoyed how the characters' introduction works both as a nostalgic exercise and a way to introduce this universe to a whole new generation of viewers.

Thirdly, I'd like to highlight the tension and the violence that are present throughout the film. There's a particular sequence where there's a masterful combo of cinematography, editing, sound design and musical score, executed in order to make the viewers feel uneasy in their seats, and it works. There's also, in this very same sequence, a brilliant deconstruction of that tension, which manages to serve as a comic relief, and I thought that was quite interesting. I can safely say that “Scream” (or “Scream 5”, in order to not get mixed up with the OG) is the most violent film in the franchise to date, relying on inventive, bloody and brutal deaths that, particularly, left my jaw dropped to the floor.

In fourth place, I'd like to highlight the film's self-referential sense of humor, which is one of the franchise's bedrocks, ever since the original film. I enjoyed how it kept always being updated, in order to match pop culture and fandom's state and situation at the films' time of release. The first one had its sense of humor built upon the revitalization of the slasher genre and the subversion of its clichés; the second one, upon the argument that sequels might be better than the original films; the third one, upon the increase in the number of stakes in the final film in a trilogy; the fourth one, upon the idea of remakes and viral videos.

And now, the fifth film deals with several aspects that are relevant and proeminent in today's pop culture: the resurrection of old franchises through “legacy sequels” (for example, what happened in films like “Star Wars: The Force Awakens” and “Ghostbusters: Afterlife”, where a relatively brand-new story is told, but that ends up including several narrative aspects that insert these films into a mythology that's already established); the toxic and, frequently, extreme nature of some fan communities; the despise of such fans towards Hollywood's constant lack of ideas, which leads the studios to reinvent iconic films under an extremely nonsensical lens; the ever-present duel between mainstream horror (“Saw”, “The Conjuring”, and “Halloween”) and elevated horror (“The Babadook”, “Hereditary”, “Midsommar” and “The VVitch”); among many other themes. I really liked how the screenwriters managed to update the franchise's recurring themes to our times.

And in last place, we have the references and easter eggs directed towards the legacy that was created and established in the past 25 years. Iconic locations that are revisited; brilliant, melancholic and nostalgic references to specific characters from previous films, both dead and alive; frames that are replicated in an almost perfect and extremely faithful way to scenes that were executed in the same way in any of the previous films, under a similar context. There are two particular sequences I'd like to highlight: the opening scene, which is the best and most tense one since the original film in 1996, with Drew Barrymore; and a scene where there's a party, which could contain a significant and symbolic double meaning for fans of the four previous films.

Meaning that, to put it short, the fifth film in the “Scream” franchise is a brilliant update of the benchmarks established 25 years ago, relying on a diverse, well-developed cast of new characters, inventive and ultraviolent deaths, shocking and surprising plot twists, a self-referential sense of humor that's current and relevant to today's times and a handful of references to the four previous films, in order to create a beautiful homage to the true slasher master that was Wes Craven. Rest in peace, Wes.)



A equipe de escalação fez um ótimo trabalho ao misturar novos e promissores atores com aqueles que já são conhecidos pelo público em geral. Eu mesmo nem conhecia grande parte dos atores adolescentes deste novo filme, e a grande maioria deles conquistou meu coração. Eu não tinha ficado impressionado com a atuação da Melissa Barrera em “Em um Bairro de Nova York”, onde para mim, sua personagem não era nada além de um interesse amoroso para o protagonista. Mas, felizmente, eu amei o desenvolvimento dela aqui. O jeito que a atriz lida com o trauma que assombra sua personagem ao longo da trama é crível, e é a principal âncora emocional do filme.

Outro destaque fica com a Jenna Ortega, cujo desenvolvimento ultrapassou completamente minhas expectativas, da maneira mais positiva possível. Ela é uma scream queen perfeita para essa nova geração, e, para mim, a escolha ideal para ser a nova protagonista da franquia, caso alguma outra sequência seja lançada (algo que eu, particularmente, espero que não aconteça, pois a conclusão deste filme foi extremamente satisfatória para mim. Mas, se o roteiro for tão bom como esse, pra mim, tá valendo). Eu, em especial, gostei muito da capacidade emocional da atriz, que é bem evoluída para alguém de sua idade. Mal posso esperar para vê-la como Wednesday Addams na série da Família Addams da Netflix, dirigida por Tim Burton.

Dou destaques também para a Jasmin Savoy Brown, que interpreta aqui o papel de cinéfila assumido por Randy e Kirby nos filmes anteriores. Ela é, de longe, a melhor personagem do filme, assim como a Kirby foi a melhor personagem de “Pânico 4”. O Jack Quaid é o alívio cômico da vez, e grande parte das piadas dele funciona. O Dylan Minnette é o nerd do grupo, e a conexão dele com os personagens dos filmes anteriores é impressionante e engraçada. O Mason Gooding e a Sonia Ben Ammar têm personagens menos desenvolvidos, mas conseguimos criar simpatia com eles, devido ao carisma dos atores. A Mikey Madison tem uma dinâmica muito boa com a Jenna Ortega. A química entre as duas nos faz pensar que elas realmente são melhores amigas. O Kyle Gallner consegue exalar uma aura ameaçadora com perfeição, o que é basicamente essencial para um papel de bad boy.

Agora, saindo dos personagens novos e indo para a velha guarda, temos performances muito competentes de Neve Campbell, Courteney Cox, David Arquette, Marley Shelton e Heather Matarazzo. Dou um destaque especial para Arquette, que conseguiu injetar muita profundidade e amargura no Dewey dessa vez, com o objetivo dele na trama indo além de impressionar a personagem de Cox e em direção à uma veia mais pessoal. Ele é, ao mesmo tempo, protetor e recluso, e Arquette consegue trabalhar com essa dualidade de forma perfeita. Como sempre, a química entre Campbell e Cox é afiadíssima e sarcástica, sendo um dos melhores alívios cômicos do filme. E, por último, temos a Marley Shelton, que consegue equilibrar muito bem uma personalidade leve e divertida com a preocupação de uma mãe por seu filho.

(The casting team did a great job in mixing new and promising faces with those that are already known to the general public. I, myself, was unaware of most of this new film's young actors, and the great majority of them has won over my heart. I wasn't impressed with Melissa Barrera's performance in “In the Heights”, where, to me, her character was nothing but a love interest to the protagonist. But, fortunately, I loved her development here. The way the actress deals with the trauma that haunts her character thoughout the plot is believable, and ends up as the film's main emotional anchor.

Another highlight stays with Jenna Ortega, whose development completely surpassed my expectations, in the most positive way possible. She's a perfect scream queen for this new generation and, to me, the ideal choice to be the franchise's new protagonist, if some other sequel finds its way into the light (something I, particularly, hope doesn't happen, as this film's conclusion was completely satisfying for me. But, if the script ends up being as good as this one, I'm all in). I, especially, really liked the actress's emotional range, which is pretty evolved for someone her age. I can't wait to see her as Wednesday Addams in the Netflix Addams Family series, which will be directed by Tim Burton.

I also want to give props to Jasmin Savoy Brown, who plays here the role of film buff that was occupied by Randy and Kirby in previous films. She is, by far, the film's best character, just like Kirby was the best character in “Scream 4”. Jack Quaid is this film's comic relief, and most of his jokes land, thankfully. Dylan Minnette is the group's nerd, and his character's connection to previous films' characters is impressive and funny. Mason Gooding and Sonia Ben Ammar have less developed characters, but we manage to care for them, due to the actors' charisma. Mikey Madison has a really good dynamic with Jenna Ortega. The chemistry between the two of them makes us actually believe they're best friends. Kyle Gallner manages to exhale a threatening aura with perfection, which is basically essential for a bad boy role.

Now, out of the new faces and in with the old school crew, we have really competent performances by Neve Campbell, Courteney Cox, David Arquette, Marley Shelton and Heather Matarazzo. I give a special highlight to Arquette, who managed to inject lots of depth and bitterness into Dewey this time around, with his objective in the plot going beyond making an impression on Cox's character and more towards a personal motive. He's simultaneously protective and reclusive, and Arquette manages to perfectly deal with this duality. As always, the chemistry between Campbell and Cox is razor-sharp and highly sarcastic, serving as one of the film's best sources of comic relief. And, lastly, we have Marley Shelton, who manages to balance a light and fun personality with the preoccupation a mother has towards her son really well.)



Nos aspectos técnicos, a equipe técnica de “Pânico” encontra uma das melhores maneiras de prestar homenagem ao legado criado há 25 anos por Wes Craven e Kevin Williamson. Há um trabalho em conjunto primoroso entre a direção de fotografia do Brett Jutkiewicz, a montagem do Michel Aller, o design de som e a trilha sonora instrumental do Brian Tyler. Estes quatro aspectos em especial têm um objetivo em comum: fazer com que as cenas envolvendo o Ghostface sejam super tensas, em um nível onde o espectador evita até se mexer no assento, com medo de estragar a experiência dos outros. Eu me atrevo até a comparar a tensão neste filme com a de “Um Lugar Silencioso”, no nível de roer as unhas mesmo, e é tão eficaz aqui quanto foi no filme de 2018.

São utilizadas tomadas mais prolongadas, quase sem cortes, com a câmera acompanhando as expressões faciais dos personagens, e suas reações no decorrer da cena, algo que, pra mim, é muito mais eficaz do que somente cortar para um outro plano ou ângulo. Eu gostei bastante de como os jumpscares não foram previsíveis, algo que acontece, em grande parte, por causa da proeza técnica executada em tela, o que é muito bom. O trabalho técnico também mostra um ótimo desempenho ao recriar cenas e enquadramentos icônicos nos filmes anteriores, da maneira mais fiel possível, o que fortalece o sentimento de nostalgia proeminente no filme.

A direção de arte encontra diversas e criativas maneiras de inserir vários easter eggs dos primeiros quatro filmes em muitas das cenas desta sequência. Recomendo que assistam à franquia inteira antes de assistir a este novo filme, porque entender estas referências é parte da diversão de assistir à uma “sequência-legado” como “Pânico”. “Star Wars”, “Halloween” e “Caça-Fantasmas” estão aí só para provar isso. Há um trabalho excelente de maquiagem e efeitos práticos aqui, em especial nas cenas de violência, onde o grotesco anda sobre uma linha muito tênue entre realista e estilizado, e consegue convencer nas duas vertentes, o que é incrível.

E, por fim, temos a trilha sonora original do Brian Tyler, que consegue andar no mesmo percurso que o compositor Marco Beltrami traçou nos filmes anteriores. É um trabalho essencialmente atmosférico, sendo um dos aspectos principais para construir a tensão que o filme propõe em entregar, e Tyler acerta em cheio nessa questão. Eu gostei bastante do uso da canção “Fall Out of Love”, da banda Salem, nos créditos finais, pela vibe dos anos 1990 que ela exala, me fazendo lembrar não só dos próprios filmes da franquia “Pânico”, mas também da canção-tema de “Buffy: A Caça-Vampiros”, que também foi exibida nos anos 1990.

(In the technical aspects, the crew of “Scream” finds one of the best ways of paying homage to the legacy created 25 years ago by Wes Craven and Kevin Williamson. There's a wonderful combo work here between Brett Jutkiewicz's cinematography, Michel Aller's editing, the sound design and Brian Tyler's original score. These four particular aspects have one common objective: to make the scenes involving Ghostface to be as tense as they can possibly be, to the point where the viewer is even scared to move around their seat, fearing it'll ruin everyone else's experience. I even dare in comparing the tension in this film to that of “A Quiet Place”, to the nail-biting level, and it's as effective here as it was in the 2018 film.

More prolonged shots are used here, with almost no cuts between them, with the camera following the characters' facial expressions, and their reactions throughout the scene, something that, to me, is far more effective than just cutting to a different shot or angle. I really enjoyed how the jumpscares weren't predictable, something that happens, in great part, due to the technical prowess displayed onscreen, which is really good. The technical work also delivers a great performance when recreating iconic scenes and shots from previous films, in the most faithful way possible, which strengthens the nostalgic feeling that's proeminent throughout the film.

The art direction and production design finds diverse and creative ways to insert several easter eggs from the first four films in various scenes in this sequel. I recommend watching the entire franchise before watching this new one, because understanding these references is part of the fun of watching a “legacy sequel” like “Scream”. “Star Wars”, “Halloween” and “Ghostbusters” are only here to prove that point. There's an excellent work of makeup and practical effects here, especially when it comes to the violent scenes, where the gore walks across a thin line between realistic and stylized, and manages to be convincing as both of them, which is amazing.

And, at last, we have Brian Tyler's original score, which manages to walk in the same steps that composer Marco Beltrami blazed through in the previous films. It's an essentially atmospheric work, being one of the main instruments to use in order to build the tension the film plans on delivering, and Tyler hits the jackpot at that particular point. I really enjoyed the use of the song “Fall Out of Love”, by the band Salem, in the final credits, because of the '90s vibe it exhales, which not only reminded me of the films in the “Scream” franchise, but also of the theme song for “Buffy: The Vampire Slayer”, which was also broadcast in the 1990s.)



Resumindo, o quinto filme da franquia “Pânico” é o melhor capítulo desde o original, de 1996, conseguindo atualizar e amplificar todas as qualidades e marcas registradas estabelecidas por Wes Craven e Kevin Williamson. Graças à uma direção certeira, um roteiro subversivo e socialmente relevante, um elenco extremamente talentoso e um uso primoroso de seus aspectos técnicos, este novo “Pânico” serve tanto como uma bela homenagem ao legado deixado pelo falecido Craven, quanto como uma porta de entrada para uma nova legião de fãs em potencial.

Nota: 10 de 10!!

É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,

João Pedro

(In a nutshell, the fifth film in the “Scream” franchise is the best installment since the original one, from 1996, managing to update and amplify every quality and benchmark established by Wes Craven and Kevin Williamson. Thanks to a razor-sharp direction, a subversive and socially relevant screenplay, an extremely talented cast and a wonderful use of its technical aspects, this new “Scream” serves both as a beautiful homage to the legacy left behind by the late Craven, and as a doorway for a whole new generation of potential fans.

I give it a 10 out of 10!!

That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,

João Pedro)


segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

"Turma da Mônica - Lições": uma sequência mais amadurecida, emocionante e diversificada (Bilíngue)

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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para trazer a primeira resenha de 2022, sobre um dos últimos lançamentos do ano passado! Mesmo repetindo alguns erros do seu ótimo antecessor, o filme em questão consegue superar seus maiores obstáculos, em termos de roteiro e desenvolvimento de personagens, para entregar uma sequência mais amadurecida, emocionante e diversificada. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “Turma da Mônica: Lições”. Vamos lá!

(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to bring you the first review of 2022, on one of last year's final film releases in Brazil! Even though it repeats some of its great predecessor's mistakes, the film I'm about to review manages to overcome its greatest obstacles, when it comes to writing and character development, in order to deliver a more matured, emotional and diverse sequel. So, without further ado, let's talk about “Turma da Mônica: Lições”. Let's go!)



Após não terem feito a lição de casa, Mônica (Giulia Benite), Cebolinha (Kevin Vechiatto), Magali (Laura Rauseo) e Cascão (Gabriel Moreira) decidem cabular aula e fugir da escola. Por consequência, um acidente envolvendo Mônica acontece, forçando os pais dos quatro amigos a reavaliarem a amizade próxima deles. A “Dona da Rua” é, então, transferida para outra escola, separando a Turma do Bairro do Limoeiro. Agora distantes, os quatro amigos terão que enfrentar as consequências de suas ações e os obstáculos iminentes da mudança e do amadurecimento, sozinhos.

(After they leave their homework undone, Monica (Giulia Benite), Jimmy Five (Kevin Vechiatto), Maggy (Laura Rauseo) and Smudge (Gabriel Moreira) decide to skip class and run away from school. As a consequence, an accident involving Monica takes place, forcing the four friends' parents to reevaluate their close friendship. The “Ruler of the Street” is, then, transferred to another school, separating the Gang from the Lemon Tree Street. Now apart from each other, the four friends will have to face the consequences of their actions and the imminent obstacles of change and coming-of-age, alone.)



Eu cresci lendo os gibis da Turma da Mônica, então, é claro que eu estava animado para ver “Turma da Mônica: Lições”, especialmente depois de ter amado o que o diretor Daniel Rezende fez no filme live-action anterior, “Turma da Mônica: Laços”, lançado em 2019 (inclusive, há uma resenha dele aqui). Depois de ter descoberto que Rezende iria voltar para comandar a sequência, fiquei instantaneamente animado para ver “Lições”, pois dava pra ver no primeiro filme que ele entendia e amava aquele universo criado pelo Mauricio de Sousa. Essa paixão do diretor foi uma das melhores coisas de “Laços”, por ela ter despertado um sentimento delicioso de nostalgia para aqueles que cresceram lendo os gibis da Turma.

Uma das coisas que mais atiçou a minha curiosidade por “Turma da Mônica: Lições” era como os roteiristas iriam lidar com o amadurecimento dos quatro protagonistas, pois, diferentemente dos atores, que cresceram bastante entre um filme e outro, os personagens não envelhecem visivelmente na trilogia de graphic novels escrita por Vitor e Lu Cafaggi, na qual os filmes se inspiram. A inserção de personagens mais crescidos na trama da sequência, como a turma jovem adulta liderada pela Tina e pelo Rolo, me pareceu uma solução para esse problema, já que, no material promocional, a personagem interpretada por Isabelle Drummond iria ser uma espécie de guia pelo amadurecimento da protagonista.

Então, com expectativas altas, que aumentaram ainda mais pela ótima recepção da crítica à sequência, fui assistir ao filme na Véspera de Ano Novo, e fico muito feliz em dizer que, embora o longa repita alguns erros cometidos pelo primeiro filme, “Turma da Mônica: Lições” supera seu antecessor com uma narrativa mais amadurecida, emocionante e diversificada, melhorando em vários aspectos que foram deixados de lado em “Laços” e colaborando cada vez mais para a construção de seu próprio universo cinematográfico à la Marvel e DC.

Ok, com isso dito, vamos falar sobre o roteiro. Escrito por Thiago Dottori (roteirista de Laços) e Mariana Zatz, a narrativa de “Turma da Mônica: Lições” já acerta por fazer seus temas principais serem o amadurecimento e a mudança, e as consequências que vêm em detrimento de ambos. Em aspectos de tom, é um filme bem mais sério, em comparação ao anterior. Não é 100% um drama, porque afinal, isso é Turma da Mônica, mas há um número considerável de cenas mais emocionalmente exigentes que permitem que os atores, em especial os mirins, evoluam em suas técnicas de atuação.

Novamente, o roteiro faz um ótimo trabalho em fazer com que a dinâmica e a amizade entre os quatro protagonistas seja o foco emocional principal do filme. Essa decisão criativa fica bem evidente ao ver os personagens falando sobre seus amigos, presente em várias nuances sutis impressas na performance física e na entrega de diálogos dos atores. Dá para sentir a falta que eles sentem de estarem um com o outro através das performances de Benite, Vechiatto, Rauseo e Moreira. Eles conseguem fazer com que nós, espectadores, acreditemos na amizade entre os quatro com primor, algo que já era evidente em “Laços”, e o roteiro de Dottori e Zatz só reforça isso, o que é maravilhoso.

A estrutura narrativa do roteiro é bem básica, provavelmente porque se trata de um filme infantil, mas carrega uma mensagem bem reconfortante e atemporal sobre amizade e união. Eu gostei de como os problemas e dilemas pessoais de cada um dos quatro protagonistas foram abordados ao longo da trama, e como, lentamente, eles vão começando a superar estes obstáculos juntos, na presença um do outro. Seria algo do tipo “a união faz a força”, conceito que já foi amplamente usado em uma multidão de filmes de diferentes gêneros, mas que acaba caindo como uma luva na narrativa elaborada por Dottori e Zatz.

Outro destaque e melhoria da sequência, em termos de roteiro, fica com a presença e o desenvolvimento de personagens coadjuvantes na trama. Ao contrário de “Laços”, que priorizou a dinâmica contrastante entre Mônica e Cebolinha, em “Lições”, há cenas dedicadas ao dia a dia individual dos quatro protagonistas, e aos novos amigos que eles vão fazendo pelo caminho. Personagens como Marina, Milena, Nimbus, Humberto e Do Contra dão as caras aqui, e o melhor é que eles não são tratados como aparições especiais ou referências, como foi com o Xaveco e o Jeremias no filme anterior. Dottori e Zatz injetam os personagens secundários da trama com basicamente a mesma quantidade de personalidade presente nos personagens-título, o que foi uma mudança muito bem-vinda.

Outra jogada de mestre feita pelos roteiristas foi a relação quase intrínseca entre a narrativa de “Turma da Mônica: Lições” e a tragédia clássica de Romeu e Julieta, que interpreta um papel chave na trama da sequência. Eu adorei a maneira com que o roteiro consegue encaixar cada arquétipo dos personagens principais da obra de Shakespeare na personalidade de certos personagens da Turma e do universo de Mauricio de Sousa. Algo que só reforça essa conexão entre as obras é a decisão de Dottori e Zatz de fazer com que a separação dos quatro amigos afete também a relação entre os pais das crianças, algo que é claramente evidente em Romeu e Julieta, já que o conflito principal da obra é entre duas famílias. Isso colabora para um maior desenvolvimento dos personagens adultos presentes na trama, algo que não se fez presente no filme anterior.

Todas as vantagens citadas acima permitem que “Turma da Mônica: Lições” seja um filme mais amadurecido, emocionante e evoluído, em relação ao original, mas, infelizmente, não é perfeito. O roteiro da sequência repete alguns dos erros mais evidentes em “Laços”, e são obstáculos que os roteiristas e a direção precisam superar para que estes filmes agradem a um público maior e mais amadurecido do que o seu alvo principal. Estas mudanças, se bem feitas, podem ser capazes de transformar essa franquia em potencial em um “Os Goonies” brasileiro, algo que entretenha crianças e adultos simultaneamente, ao invés de um “Patrulha Canina” ou qualquer outra obra mais direcionada à um público majoritariamente infantil.

Por exemplo, o senso de humor. Houveram alguns momentos que me fizeram rir bastante, especialmente em relação à um personagem bem específico, mas há uma certa “infantilização” na abordagem da história de “Lições” que pode até ter funcionado em “Laços”, já que era o primeiro filme e os atores estavam mais novos. Infelizmente, essa mesma pegada não combina com os temas de amadurecimento e crescimento presentes na sequência. Eu sei o que vocês podem dizer: “Ah, mas é um filme infantil, foi feito pras crianças”. E para isso, eu digo: as crianças não vão assistir ao filme no cinema sozinhas, vão? Assim como a narrativa, o senso de humor destes filmes em live-action precisa de um amadurecimento para ir além de seu público-alvo e agradar também, de forma eficiente, a “velha guarda” de fãs da Turminha que cresceu lendo os gibis.

Outro exemplo de como o roteiro esquece de agradar a um público mais velho e amadurecido fica com a falta de lógica e realismo de algumas cenas. Isso não só diminui a credibilidade e a fidelidade à própria mitologia criada nos quadrinhos daquilo que está sendo mostrado em tela, como também previne que o efeito emocional de algumas cenas atinja seu potencial máximo. E, para falar mais a fundo sobre isso, preciso fazer uso de alguns leves SPOILERS, então, se você não quiser saber de nenhum detalhe antes de assistir ao filme, é melhor pular esses parágrafos seguintes. Se você não se importa, leia por sua própria conta e risco.

------------------------------------------------- [SPOILERS] --------------------------------------------------------

Há duas sequências em particular que exemplificam perfeitamente esta falta de lógica no roteiro de Dottori e Zatz. A primeira seria uma cena onde Mônica é provocada por um valentão mais alto e mais velho que ela na nova escola, e para rebater, ela decide dar uma coelhada nele. Não só o valentão consegue impedir com que a protagonista dê a coelhada, como também rouba o Sansão das mãos dela, e ela não faz NADA a respeito. Para uma personagem que promete ser um modelo de empoderamento por sua força e coragem, o roteiro cometeu um deslize tremendo com a protagonista, deixando entender que toda a força da Mônica reside apenas no Sansão, o que contradiz completamente a personalidade da personagem nos quadrinhos.

Outro exemplo seria uma cena, perto da conclusão do filme, onde os quatro se reencontram depois de algum tempo separados. É uma cena que pretende ser o pico emocional de “Lições” e, em parte, funciona, pela capacidade dos atores e pela proeza técnica exibida na sequência. Mas, considerando a temporalidade do longa-metragem, os quatro personagens não ficaram distantes por muito tempo para que esse reencontro seja uma verdadeira maré de emoções. Do jeito que a cena é apresentada, parece que a Mônica tinha sido sequestrada ou algo do tipo para que todos desabassem do jeito que fizeram. Então, pelo menos, no meu ponto de vista, houve um certo exagero na construção dessa cena, considerando a temporalidade da trama de “Turma da Mônica: Lições”.

--------------------------------------- [FIM DOS SPOILERS] -----------------------------------------------------

Felizmente, estes foram os únicos tropeços dessa ótima narrativa, a qual evoluiu bastante do primeiro filme para a sequência, apresentando personagens novos, temáticas bastante interessantes para seu público-alvo e uma constante expansão de sua mitologia, estabelecida nos quadrinhos de Mauricio de Sousa. Façam a si mesmos um favor e fiquem até o meio dos créditos, porque há uma pequena sequência que dá uma dica do futuro da franquia, e que será um verdadeiro deleite para quem é fã de carteirinha do universo criado pelo nosso Stan Lee brasileiro. É isso.

(I grew up reading the Monica's Gang comic books in Brazil, so, of course I was excited to watch their new film, “Turma da Mônica: Lições”, especially after I fell in love with what director Daniel Rezende did in the previous live-action film, “Turma da Mônica: Laços”, released in 2019 (by the way, you can read my review on it right here). After I found out that Rezende would return to helm the sequel, I was instantly excited to watch “Lições”, as you could see in the first film that he understood and loved that universe created by Mauricio de Sousa. That passion from the director was one of the best things about “Laços”, as it awakened a delicious feeling of nostalgia in those who grew up reading these comics.

One of the things that made my curiosity grow higher in regards to “Turma da Mônica: Lições” was in how the screenwriters would deal with the four protagonists coming of age, because, unlike the actors, who grew up significantly between one film and another, the characters don't visibly age in the graphic novel trilogy authored by Vitor and Lu Cafaggi, which inspired these films. The insertion of more mature characters in the sequel's plot, such as the young adult group led by Tina and Curly, seemed like a solution to that problem, as seen that, in the film's promotional material, Isabelle Drummond's character would serve as some sort of guide through the protagonist's coming-of-age.

So, with very high expectations, which became even higher due to the sequel's great critical reception, I watched the film on New Year's Eve, and I'm really glad to say that, even though it repeats some of the first film's mistakes, “Turma da Mônica: Lições” surpasses its predecessor with a more mature, emotional and diverse storyline, improving on several aspects that were cast aside in “Laços” and collaborating more and more to the construction of its own cinematic universe, much like the ones at Marvel and DC.

Ok, with that out of our way, let's talk about the screenplay. Written by Thiago Dottori (who wrote the screenplay for “Laços”) and Mariana Zatz, the narrative of “Turma da Mônica: Lições” already strikes a home run for making changes and coming-of-age its main themes, as well as the consequences both things bring with them. When it comes to tone, it's a much more serious film, when compared to the previous one. It's not 100% a drama, because after all, this is Monica's Gang we're talking about, but there's a considerable amount of more emotionally demanding scenes that allow the actors, especially the child ones, to evolve in their acting techniques.

Once again, the screenplay does a great job in putting the dynamics and friendship between the four protagonists as the film's main emotional focus. This creative decision becomes really evident when we see the characters talking about their friends, present in various subtle nuances imprinted in the actors' physical performance and dialogue delivery. You can feel how much they miss being around each other through the performances of Benite, Vechiatto, Rauseo and Moreira. They manage to masterfully make us, viewers, believe in the friendship between the four of them, something that was already evident in “Laços”, and Dottori and Zatz's screenplay only reinforces that, which is wonderful.

The screenplay's narrative structure is pretty basic, probably because this is a film targeted at children, but it carries a very comforting and timeless message on friendship and togetherness. I really liked how each character's personal problems and dilemmas were dealt with throughout the plot, and how, slowly, they start overcoming these obstacles together, while they're around each other's presence. It would be something like the saying “there is strength in numbers”, a concept that has been used in a multitude of films in various genres, but that ends up fitting like a glove in the narrative elaborated by Dottori and Zatz.

Another highlight and improvement made by the sequel, when it comes to screenwriting, relies on the presence and development of supporting characters. Unlike “Laços”, which focused on the contrasting dynamics between Monica and Jimmy Five, in “Lições”, there are several scenes dedicated to the individual daily life of its four protagonists, and the new friends they make along the way. Characters like Marina, Milena, Nimbus, Hummer and Nick Nope show their faces here, and the best thing about them is that they are not treated as just cameos or easter eggs, as it happened to Sunny and Jeremiah in the previous film. Dottori and Zatz inject the plot's secondary characters with as much personality as the title characters, which was a very welcome change.

Another great move by the screenwriters was the almost intricate connection between the narrative of “Turma da Mônica: Lições” and the timeless tragedy of Romeo and Juliet, which plays a major role in the sequel's plot. I loved the way the screenplay manages to fit each archetype from the main characters in Shakespeare's work within the personality of certain characters in the Gang and in Mauricio de Sousa's universe. One fact that only reinforces that connection between the two narratives is Dottori and Zatz's decision of making the four friends' separation impact the relationship between the children's parents, something that is clearly evident in Romeo and Juliet, as the main conflict in the work is between two families. This allows for a greater development in the plot's adult characters, something that didn't happen in the previous film.

All the advantages stated above allow that “Turma da Mônica: Lições” transforms into a more mature, emotional and evolved film, if compared to the first film, but, unfortunately, it's not perfect. The sequel's screenplay repeats some of the most evident mistakes in “Laços”, and these are obstacles that the screenwriters and direction need to overcome, in order for these films to reach and please a wider, older audience than its main target audience. These changes, if well done, have the ability to transform this potential franchise into a Brazilian “Goonies”, something that'll simultaneously please both children and adults, rather than a Brazilian “Paw Patrol” or anything else that's specifically directed towards a younger, toddler-like audience.

For example, the sense of humor. There were a few moments that made me laugh a lot, especially when it came to a really specific character, but there's a certain “childishness” to the story's approach in “Lições”, which might have worked in “Laços”, as it was the first film and the actors were younger. Unfortunately, that same vibe doesn't go well with the coming-of-age, growing up themes that are essential to the sequel. I know what you might say: “Oh, but it's a film for children, it was made for them”. And to that, I say: children aren't going to the movies to watch it alone, are they? Like the narrative itself, the sense of humor in these live-action films needs to grow up in order to go beyond its target audience and also please, in an efficient way, the “old school” people who grew up reading the Gang's comics.

Another example on how the screenplay forgets to please a more adult, mature audience relies on the lack of logic and realism in some scenes. Not only does this creative choice diminishes the credibility and faithfulness to the mythology that was created in the comics of what's happening onscreen, it also prevents certain scenes from achieving their maximum emotional, tear-jerking effect. And, to explain more about this, I have to use some mild SPOILERS, so, if you don't want to know any details before seeing the film, I recommend skipping these next paragraphs. If you don't mind, read at your own risk.

---------------------------------------------- [SPOILERS] ------------------------------------------------------------

There are two particular sequences that perfectly exemplify this lack of logic in Dottori and Zatz's screenplay. The first one would be a scene where Monica is taunted by a taller, older bully in her new school, and, to strike back, she tries to hit him with her plush bunny. Not only does the bully manage to prevent her from hitting him, he also takes her plush bunny with him and she does absolutely NOTHING about it. For a character that intends to be a role model of empowerment for her strength and courage, the screenplay suffered a tremendous slip for the character, leaving us to understand that all of Monica's strength resides in Samson, her plush bunny, which completely contradicts her personality in the comics.

Another example would be a scene that's close to the film's conclusion, which depicts the four friends reuniting after some time apart. It's a scene that intends to be the emotional peak of “Lições”, and partly, it works, because of the actors' capacity and the technical prowess displayed onscreen. But, considering the timeline of the film, the four characters didn't stay apart for enough time, in order for that moment to become a whirlwind of emotions. Considering the way it is presented, it seemed like Monica was kidnapped or something for all of them to fall apart like they did. So, at least for me, there was a certain exaggeration in that scene's construction, considering the timeline of the plot of “Turma da Mônica: Lições”.

---------------------------------------- [END OF SPOILERS] ------------------------------------------------------

Fortunately, those were the only missteps in this great narrative, which evolved a lot from the first film to this one, introducing new characters, interesting themes for its target audience and a constant expansion of its mythology, established in Mauricio de Sousa's comics. Do yourselves a favor and stay through the first half of the credits, because there's a small sequence that gives a hint of the franchise's future, and that will be a real delight to those who are real, true fans of the universe created by our Brazilian Stan Lee. That's it.)



Eu gostei bastante do desempenho dos quatro protagonistas, assim como em “Laços”, e gostei especialmente do foco que o roteiro da sequência deu a cada um, mais especificamente para a Magali e o Cascão, que foram basicamente deixados de lado no primeiro filme. Os dilemas e as mudanças propostas pelo roteiro ficam mais evidentes através da performance da Giulia Benite como Mônica. É impossível não sentir dó e pena da personagem ao vê-la entrar na nova escola e ser completamente ignorada pelos colegas e criticada pelos valentões. O arco da personagem de Benite é o melhor do filme e o que mais mostra o crescimento da personagem. Eu gostei de como o objetivo principal do Kevin Vechiatto como Cebolinha nesse filme não é encher o saco da Mônica, e sim recuperar a companhia da personagem, dando continuidade ao cativante e fofo interesse amoroso entre os dois, o qual já foi evidente no final do primeiro filme.

Eu fiquei impressionado com a capacidade emocional da Laura Rauseo como a Magali, e especialmente de como a atriz lida com a ansiedade da personagem. É, ao mesmo tempo, algo sensível e cômico, já que essa ansiedade é intrinsecamente ligada à fome insaciável da Magali. Eu gostei bastante do desenvolvimento do Cascão, interpretado pelo Gabriel Moreira. É muito bom ver o personagem sendo algo mais do que um simples alívio cômico e parceiro do Cebolinha, e realmente ter sua subtrama específica na narrativa. Mesmo sendo a menos desenvolvida entre as quatro subtramas individuais, ainda sim é bem engraçada, e Moreira consegue protagonizar algumas das cenas mais hilárias e descontraídas do filme.

Eu adorei ver como os roteiristas designaram um personagem secundário para desenvolver cada um dos quatro protagonistas: para a Mônica, temos a Marina de Laís Vilela, a qual eu gostaria de ter visto mais, pelo imenso carisma que a atriz possui; para o Cebolinha, temos o Humberto de Lucas Infante, que foi, de longe, o melhor personagem do filme para mim, porque toda cena onde ele aparece consegue ser essencialmente hilária; para a Magali, temos a Milena de Emily Nayara, que mostra ter muita personalidade e segurança em seu papel, o que é sempre bom; e para o Cascão, temos o Do Contra de Vinicius Higo, que consegue ser engraçado sem ser irritante pelo jeito, bem, “do contra” dele de ser. (Risos)

E, do lado mais adulto, temos a Isabelle Drummond, que caiu como uma luva no papel da Tina. Sinceramente, não consigo pensar em nenhuma atriz melhor para interpretar esse papel. A Tina dela é um tipo de refúgio emocional para a Mônica de Benite, e as lições que ela aprende com a personagem de Drummond são essenciais para o encerramento do arco narrativo da protagonista. Mas o verdadeiro destaque nas performances adultas fica, especificamente, com a Monica Iozzi e a Fafá Rennó como as mães da Mônica e do Cebolinha, respectivamente. A discórdia que as duas personagens sofrem ao longo da trama é bem realista, e as atrizes conseguem lidar com ela muito bem. Eu dou um destaque especial para Iozzi, pelas cenas que ela compartilha com Benite, pois elas demonstram perfeitamente a preocupação que sua personagem tem pela filha.

(I really liked the four protagonists' performances, just like in “Laços”, and I especially enjoyed the focus the sequel's screenplay gave to each one of them, especially to Maggy and Smudge, who were basically set aside in the first film. The dilemmas and changes proposed in the screenplay are more evident through Giulia Benite's performance as Monica. It's impossible not to feel sorry or pitiful for the character when seeing her arrive at the new school and being instantly ignored by her peers and taunted by bullies. The arc of Benite's character is the film's best and the one that most displays how much the character has grown throughout the plot. I liked how Kevin Vechiatto's main objective as Jimmy Five in this film isn't giving Monica a hard time, but regaining the character's companionship, which continues the captivating and cute love interest between the two of them, which was already evident in the first film's conclusion.

I was impressed with Laura Rauseo's emotional capacity as Maggy, and especially with how the actress deals with the character's anxiety. It's something that's, simultaneously, sensitive and comical, as such anxiety is intricately connected to Maggy's insatiable hunger. I really liked Smudge's development, while being portrayed by Gabriel Moreira. It's so good to see the character grow from being just a comic relief and sidekick to Jimmy Five, and actually become a character with a subplot to call his own. Even though it's the least developed one out of the main four individual subplots, it's really funny nonetheless, and Moreira manages to play a main role in some of the film's most hilarious and uncompromising moments.

I loved to see how the screenwriters designated a secondary character to develop each one of our four protagonists: for Monica, we have Laís Vilela's Marina, which I wish I had seen more of, because of the actress's immense charisma displayed onscreen; for Jimmy Five, we have Lucas Infante's Hummer, who was, by far, the film's best character for me, as every scene that he's in manages to be essentially funny; for Maggy, we have Emily Nayara's Milena, who displays an enormous amount of personality and security in her role, which is always a good thing; and for Smudge, we have Vinicius Higo's Nick Nope, who manages to be funny without being annoying because of his, well, “alternative” way of life. (LOL)

And, on the more adult side, we have Isabelle Drummond, who fit like a glove in the role of Tina. I honestly couldn't think of anyone better to play this role than her. Her Tina is like an emotional refuge for Benite's Monica, and the lessons that she learns from Drummond's character are essential to the closure of the protagonist's narrative arc. But the true highlight in the adult performances shines upon Monica Iozzi and Fafá Rennó as Monica and Jimmy Five's respective mothers. The disagreement that both characters suffer throughout the plot is quite realistic, and the actresses deal with it really well. I'm giving a special mention to Iozzi, because of the scenes she shares with Benite, as they perfectly exemplify the preoccupation and worry her character has towards her daughter.)



Nos aspectos técnicos, “Turma da Mônica: Lições” encontra maneiras inventivas e criativas para replicar o teor "cartunesco" (no bom sentido) do universo que o inspirou. Não há nada de absolutamente revolucionário no quesito técnico do filme, mas tudo aqui funciona muito bem. Um detalhe que me chamou bastante a atenção foi a transição extremamente fluida feita na cena inicial de “Lições”, que primeiramente, retrata uma encenação bem produzida de Romeu e Julieta. Tudo vai correndo bem, até que um dos personagens erra a fala ou deixa, aí é feito um corte perfeito para a realidade, onde Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali estão ensaiando a peça em casa. Foi uma colaboração muito bem feita entre a direção de fotografia do Azul Serra e a montagem do Marcelo Junqueira.

Toda a equipe responsável pela estética visual de “Lições”, incluindo o trabalho de direção de arte da Mariana Falvo, os figurinos de Fernanda Marques e Manuela Mello, e a maquiagem e penteado de Gabi Britzki e Ana Carla Silva, trabalha em conjunto para inserir a máxima quantidade possível de referências e easter eggs em cada quadro do filme. Rascunhos de personagens conhecidos de Mauricio de Sousa, aparições breves, mas perceptíveis de figuras importantes na produção dos quadrinhos e da adaptação. Fiquem de olho aberto para perceberem todas, porque vale a pena. Além dos easter eggs, o trabalho estético aplicado aqui é simplesmente sensacional. Uma explosão de cores vibrantes e fortes, toda cena consegue ser um verdadeiro deleite para os olhos, fortalecendo a nostalgia que fez o primeiro filme ser tão bom.

Falando em “nostalgia”, temos aqui mais um aspecto técnico que dá uma ajudinha a mais para fortalecer este sentimento: a trilha sonora instrumental, composta novamente por Fabio Góes. É incrível ver e ouvir como as faixas de Góes combinam tão bem com as cenas onde elas são tocadas. Eu me atrevo a dizer que a trilha sonora destes filmes é o aspecto que mais desperta um sentimento de nostalgia no espectador. Não sei porque, mas elas me fazem lembrar muito das épocas do Cine Gibi (quem mais lembra dessas pérolas?) e das faixas que embalavam as historinhas da Turma nestes filmes. Assim como em “Laços”, onde uma cena contou com uma canção original de Tiago Iorc, há uma cena na sequência onde é tocada uma canção original de Duda Beat e Flor Gil. A música, intitulada “Que Som é Esse?”, é bem mais dançante do que a de Iorc, mas, pelo menos para mim, é bem mais fraquinha e não combina com a vibe de amadurecimento proposta pelo roteiro.

(In the technical aspects, “Turma da Mônica: Lições” finds inventive and creative ways to replicate the cartoonish feel of the universe that inspired it (in a good way). There's nothing absolutely revolutionary when it comes to the film's technical side, but everything works really well here. One detail that particularly caught my eye was the extremely fluid transition made in the opening scene of “Lições”, which at first, portrays a well-produced staging of Romeo and Juliet. Everything goes on really well, until one of the characters misses their line or cue, then there's a perfect cut to reality, where Monica, Jimmy Five, Smudge and Maggy are rehearsing the play at home. It was a really well-done collaboration between Azul Serra's cinematography and Marcelo Junqueira's editing.

All the crew that was responsible for the visual aesthetic of “Lições”, including Mariana Falvo's production design, Fernanda Marques and Manuela Mello's costume design, and Gabi Britzki and Ana Carla Silva's makeup and hairstyling, works in tandem in order to insert the maximum amount of references and easter eggs in each frame in the film. Doodles of well-known characters by Mauricio de Sousa, brief yet perceptible appearances by important figures in the production of the comics and the adaptation. Keep your eyes peeled in order to catch all of them, because it's worth it. Besides the easter eggs, the aesthetic work applied here is simply sensational. An explosion of vibrant, strong colors, each scene manages to be a true delight to the eyes, strengthening the nostalgia that made the first film so enjoyable.

Speaking of “nostalgia”, we have here one more technical aspect that gives an extra push to make that feeling even stronger: the original score, composed once again by Fabio Góes. It's amazing to see and hear how well Góes's tracks fit the scenes where they're played in. I dare to say that these films' scores are the aspect that most awakens that nostalgia in the viewer. I don't know why, but they remind me a lot of the times of “Cine Gibi” (anyone else remembers these gems?) and the tracks that played during the Gang's stories in these films. Just like in “Laços”, where a scene featured an original song by Tiago Iorc, there's a scene in the sequel where an original song by Duda Beat and Flor Gil is played. The song, titled “Que Som É Esse?” (or “What's That Sound?”), is way more danceable than Iorc's, but, in my opinion, is way weaker and doesn't match the coming-of-age theme proposed by the screenplay.)



Resumindo, “Turma da Mônica: Lições” repete alguns dos erros do filme anterior, mas, assim como as melhores lições, o diretor Daniel Rezende e sua equipe conseguem aprender e evoluir bastante na sequência, contando com uma narrativa mais amadurecida, um elenco cativante de personagens muito bem desenvolvidos e um sensacional trabalho técnico, o qual acentua o sentimento de nostalgia que fez o primeiro filme ser tão bom. Mal posso esperar pelo próximo passo da franquia, especialmente depois da cena pós-créditos!

Nota: 9,0 de 10!!

É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,

João Pedro

(In a nutshell, “Turma da Mônica: Lições” repeats some of the previous film's mistakes, but, just like the best lessons, director Daniel Rezende and his crew manage to learn and evolve a lot in the sequel, relying on a more mature, grown-up narrative, a captivating cast of very well-developed characters and a sensational technical work, which accentuates the feeling of nostalgia that made the first film so enjoyable. I can't wait for this franchise's next step, especially after the post-credit scene!

I give it a 9,0 out of 10!!

That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,

João Pedro)