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E aí, meus queridos cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para falar sobre um dos lançamentos mais recentes e um dos filmes mais aguardados do ano, o qual já está em exibição nos cinemas! Ousado por sua abordagem de uma história convencional sob um viés nada convencional, o filme em questão consegue transmitir sua mensagem com sucesso por meio do uso brilhante de simbolismos no roteiro, das atuações de seu elenco extremamente talentoso, e do caráter natural e realista injetado em seus aspectos técnicos. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “Até os Ossos”. Vamos lá!
(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to talk about one of the most recent film releases as well as one of the year's most anticipated films, which is now playing in theaters! Bold for its approach of a conventional story under an unconventional point of view, the film I'm about to review manages to successfully convey its message through the screenplay's brilliant use of symbolism, the performances of its extremely talented cast, and the natural, realistic vibe injected in its technical aspects. So, without further ado, let's talk about “Bones and All”. Let's go!)
Baseado no romance de mesmo nome de Camille DeAngelis, o filme é ambientado nos EUA durante a administração de Ronald Reagan na década de 1980, e acompanha Maren Yearly (Taylor Russell), uma jovem moça com instintos canibais que, após ser abandonada pelo pai (André Holland), embarca em uma jornada pelo país em busca de sua mãe, a qual ela nunca conheceu. Ao longo da viagem, ela encontra Lee (Timothée Chalamet), um jovem solitário, em quem Maren encontra um refúgio, e os dois começam a formar uma conexão bem forte, constantemente ameaçada pelos perigos que a estrada oferece.
(Based on the novel of the same name by Camille DeAngelis, the film is set in the United States during the Ronald Reagan administration in the 1980s, and follows Maren Yearly (Taylor Russell), a young woman with cannibalistic instincts who, after being abandoned by her father (André Holland), embarks on a journey across the country looking for her mother, who she never met. Throughout the trip, she meets Lee (Timothée Chalamet), a lonely young man, in whom Maren finds refuge, and the two of them begin to forge a very strong bond, which is constantly threatened by the dangers the road offers.)
Assim como basicamente todos os filmes que analisei este ano, é claro que eu estava muito animado para assistir “Até os Ossos”. Devo admitir que não sou tão familiarizado com o trabalho do diretor Luca Guadagnino, tendo visto apenas o seu remake de “Suspiria”, lançado em 2018. Mas quando descobri que a adaptação do trabalho de Camille DeAngelis iria reunir o cineasta com Timothée Chalamet, protagonista indicado ao Oscar de seu maior sucesso, “Me Chame Pelo Seu Nome”, drama romântico vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Adaptado, o filme conseguiu atiçar minha curiosidade. Consequentemente, essa curiosidade se transformou em completa e ininterrupta atenção quando descobri que a narrativa se tratava de uma história de amor entre dois canibais.
Desde então, minhas expectativas subiram exponencialmente, me levando a esperar ansiosamente pelas primeiras reações à nova obra de Guadagnino no Festival de Veneza, imaginando como as pessoas iriam reagir a essa mistura nada convencional entre romance e terror. E “Até os Ossos” não só foi majoritariamente muito bem recebido pela crítica, como também venceu os prêmios de Melhor Direção e Melhor Atuação Jovem (Taylor Russell) no evento. Isso me fez considerar fortemente que o filme seria o retorno de Guadagnino à temporada de premiações após as reações mistas de “Suspiria”, tanto pela crítica quanto pelo público. Pelo que o trailer, meticulosamente bem calculado e montado, mostrava, “Até os Ossos” parecia misturar a atmosfera de suspense e terror presente em “Suspiria” com a sensibilidade romântica de “Me Chame Pelo Seu Nome”.
E foi exatamente isso que aconteceu. Guadagnino conseguiu atender às minhas expectativas por trabalhar o roteiro de David Kajganich sob duas vertentes: como uma história convencional que mistura romance e terror de forma sublime; e como uma reflexão metafórica sobre identidade e pertencimento, usando o canibalismo como uma fonte de interpretações e simbolismos. Há quatro razões às quais atribuo o porquê do roteiro de Kajganich funcionar tão bem: a estrutura de road movie (filmes que retratam uma viagem) e como ela se conecta com o desenvolvimento do arco narrativo da protagonista; a mistura de gêneros completamente opostos que, na teoria, não deveriam funcionar tão bem; o uso bem calculado da violência, retratada de uma forma realista, e não sensacionalista; e a possibilidade de conectar as circunstâncias em que os personagens se encontram com a realidade, tendo como base a ambientação.
O fato do roteiro de Kajganich ser composto, majoritariamente, de uma grande viagem, colabora para que “Até os Ossos” funcione como uma série de vinhetas, nas quais a protagonista encontra novos personagens a cada parada e, baseado nos relatos de cada um, inicia um processo de autodescoberta que vai se desenrolando ao longo do tempo de duração extremamente bem calculado de 2 horas e 10 minutos. Particularmente, admiro a decisão criativa do roteirista de retratar a protagonista como alguém que está em constante dúvida e quer mudar, mas que, ao mesmo tempo, não consegue resistir aos seus instintos mais primitivos. Dito isso, na minha opinião, o novo filme de Luca Guadagnino é, acima de tudo, um filme sobre amadurecimento, sobre descobrir o seu lugar no mundo, sobre ter novas experiências, e sobre o efeito que estas experiências têm na formação de uma pessoa.
É incrível a maneira com que Kajganich mistura o romance com o terror de uma maneira intrinsecamente homogênea no roteiro, de modo que o filme não funcionaria de uma forma tão eficiente se ele pertencesse à somente um destes gêneros. Se “Até os Ossos” fosse apenas um filme de romance, não seria algo tão original e ousado; da mesma maneira que ele seria incapaz de transmitir a sensibilidade do relacionamento cativante entre os dois protagonistas de uma maneira tão impactante, se fosse apenas um filme de terror. É justamente pelo equilíbrio entre os dois gêneros que o roteiro acaba funcionando. Hoje em dia, parece existir um preconceito por parte de algumas premiações de subestimarem (e esnobarem) obras de terror (a última que me lembro de ter um reconhecimento mais amplo foi “Corra!”, de 2017), então o fato de que “Até os Ossos” não se encaixa somente como um filme de terror pode possibilitar uma visibilidade maior na vindoura temporada de premiações.
Outro destaque do roteiro e, por consequência, da direção de Guadagnino foi a decisão de não retratar a violência inerente na narrativa de uma forma demasiadamente estilizada, a ponto de parecer sensacionalista. Tanto que, em nenhum momento, “Até os Ossos” faz apologia ao canibalismo. Ao invés disso, Kajganich e Guadagnino retratam estas cenas de uma maneira extremamente realista, mas não tão expositiva como alguém pode imaginar. Permitam-me exemplificar: há uma cena onde a protagonista se alimenta de uma mulher, juntamente com um canibal mais velho. No momento em que a personagem dá a primeira mordida, a câmera corta para retratos e fotos da vítima com sua família, acompanhados pelo som da mastigação dos dois canibais. Essa dinâmica da câmera com o som acaba fazendo da cena algo mais angustiante e agonizante do que simplesmente grotesca, porque induz o espectador a imaginar o que está acontecendo com a vítima, e é muito mais sinistro e assustador dessa maneira.
E mesmo sendo um filme com personagens canibais, “Até os Ossos” não tem como seu principal objetivo despertar a repulsa do espectador por esses personagens. Pelo contrário, na verdade, através dos diálogos compartilhados entre eles, Kajganich e Guadagnino conseguem o impossível e realmente fazem o espectador entender o porquê destas pessoas serem da maneira que são. E é aqui que o canibalismo passa a ser analisado de uma maneira mais metafórica do que literal, tomando como base a ambientação na América de Ronald Reagan. Embora vários historiadores definem Reagan como um dos melhores presidentes dos EUA, outros estudiosos vêm analisando o envolvimento (ou melhor, a falta de envolvimento) do ex-presidente quando o assunto se trata de direitos civis. Ele se opôs à Lei dos Direitos Civis de 1964 e à Lei dos Direitos de Voto de 1965, que proibiriam a discriminação baseada na cor da pele, religião, gênero e nacionalidade das pessoas. Inicialmente, ele era contra à definição do dia de Martin Luther King como feriado nacional, mas acabou cedendo em 1983. E, de uma maneira mais impactante, Reagan mostrou uma quase total indiferença à epidemia de HIV, que na época, era vista como uma doença que só afetava pessoas homossexuais, suposição que foi desmentida com o tempo.
E é na ambientação que mora o “xis” da questão: os canibais de “Até os Ossos” são, em sua essência, pessoas deixadas às margens da sociedade, pessoas que são definidas pela falta de pertencimento (vulgo, as mesmas pessoas prejudicadas pela administração de Reagan) e que, por isso, não veem outra escolha senão se entregarem completamente à sua natureza. Com isso em mente, é incrível como Kajganich traz, como ponto de vista principal do roteiro, alguém que está rodeada de incertezas sobre quem ela é e em quem ela pode confiar, desenvolvendo a protagonista de uma maneira tão perfeita que chega até a ser catártico, quando os créditos começam a rolar.
Dito isso, acredito que sim, “Até os Ossos” pode ter uma visibilidade maior na atual temporada de premiações do que obras anteriores de terror aclamadas pela crítica, devido à sua mistura de gêneros e, principalmente, pelo caráter simbólico da narrativa, que acaba conectando-a com a realidade de uma maneira impecável. Se fosse minha a decisão, o filme seria facilmente um dos indicados a Melhor Filme, Direção e Roteiro Adaptado no Oscar 2023. Filmes com uma abordagem corajosa como a de “Até os Ossos” aparecem muito raramente, em especial um que consiga causar uma reflexão sobre a sociedade atual a partir do passado. Infelizmente, receio que o Oscar ainda não esteja pronto para uma decisão tão ousada. Porém, continuarei na torcida, porque no final das contas, a esperança é a última que morre... (Risos)
(Just like basically every movie I've reviewed this year, obviously I was very excited to watch “Bones and All”. I must admit, I'm not that familiar with the work of director Luca Guadagnino, having only watched his 2018 remake of “Suspiria”. But when I found out that this adaptation of Camille DeAngelis's work would reunite the filmmaker with Timothée Chalamet, the Oscar-nominated protagonist of his biggest hit, “Call Me By Your Name”, a romantic drama that won the Oscar for Best Adapted Screenplay, it managed to entice my curiosity. Consequently, that curiosity turned into complete and undying attention when I found out the narrative was a love story between two cannibals.
Since then, my expectations had nowhere to go but up, leading me into anxiously waiting for the first reactions to Guadagnino's new work during the Venice Film Festival, wondering how people would react to this anything-but-conventional mixture between romance and horror. And “Bones and All” not only was, in its majority, very positively received by critics; it also won the event's awards for Best Direction and Best Performance By An Emerging Actor or Actress (Taylor Russell). That made me strongly consider the film as Guadagnino's potential return to awards season after the mixed reactions towards “Suspiria”, both by critics and audiences. Based on what the trailer displayed, in a meticulously well-calculated and edited way, “Bones and All” seemed to mix the atmosphere of suspense and horror in “Suspiria” with the romantic sensibility of “Call Me By Your Name”.
And that's exactly what happened. Guadagnino has managed to meet my expectations by working with David Kajganich's screenplay under two perspectives: as a conventional story that sublimely mixes romance with horror; and as a metaphorical reflection on identity and belonging, using cannibalism as a source of symbolisms and interpretations. There are four reasons to which I attribute why Kajganich's screenplay works this well: the road movie structure and how it connects with the development of the protagonist's narrative arc; the mixture between completely opposite genres that, in theory, shouldn't work well; the well-calculated use of violence, portrayed as realistic rather than scandalous; and the possibility of connecting the circumstances the characters find themselves in with reality, based on its setting.
The fact that Kajganich's screenplay is mostly composed by one big trip helps to make “Bones and All” work as a series of vignettes, in which the protagonist meets new characters and, based on what they have to say, begins a process of self-discovery that's developed throughout its well-calculated runtime of 2 hours and 10 minutes. I particularly admire the screenwriter's creative decision to portray the protagonist as someone who is in constant doubt and wants to change, but that, at the same time, doesn't manage to resist her most primitive instincts. With that said, in my opinion, Luca Guadagnino's film is, above everything, a coming-of-age film, working through finding out one's place in the world, trying out new experiences and the impact these experiences have in a person's formation.
It's simply amazing how Kajganich mixes romance with horror in an intricately uniform way in the screenplay; so intensely that the film wouldn't have worked as effectively if it had belonged to only one of these genres. If “Bones and All” was just a romance movie, it wouldn't have been as original or as bold; in the same way it would be unable to convey the sensibility in the captivating relationship between the two protagonists in such an impactful way, if it was just a horror film. It's precisely because of the balance between the two genres that the screenplay ends up working. Nowadays, there seems to exist a prejudice coming from certain award shows of underestimating (and snubbing) horror films (the last one I remember having wider recognition was 2017's “Get Out”), so the fact that “Bones and All” doesn't fit as just a horror film might make a wider recognition towards it in the upcoming award season all the more possible.
Another highlight in the script and, consequently, in Guadagnino's direction was the decision of not portraying the inherent violence in the narrative as something highly stylized, to the point of being scandalous and controversial. As a matter of fact, none of the scenes of “Bones and All” portray cannibalism as something that's acceptable. Instead, Kajganich and Guadagnino portray these scenes in an extremely realistic manner, but not as exposed as one may think. Allow me to explain with an example: there's a scene where the protagonist feeds off a woman, alongside an older cannibal. At the moment the character has her first bite, the camera cuts away to portraits and photos of the victim with her family, accompanied by the chewing sound of the two cannibals. This camera-sound dynamic ends up making the scene more unnerving and agonizing rather than just grotesque, as it induces the viewer to imagine what's happening to the victim, and it's way more sinister and frightening that way.
And even though it's a film with cannibal characters, the main objective of “Bones and All” isn't to make the viewer feel repulsed towards these characters. On the contrary, actually, through the dialogue shared between them, Kajganich and Guadagnino do the impossible and really make the viewer understand the reasons why these people are the way they are. And it's here that cannibalism ends up being analyzed in a more metaphorical way than a literal one, based on its setting in Ronald Reagan's America. Even though several historians place Reagan as one of the best presidents of the United States, other scholars analyzed the former president's involvement (or even better, the lack of an involvement) when it came to the subject of civil rights. He opposed to 1964's Civil Rights Act and to 1965's Voting Rights Act, which would prohibit any kind of discrimination based on a person's color, religion, gender and nationality. Initially, he was against the definition of Martin Luther King Day as a national holiday, but ended up giving in in 1983. And, in a more impactful way, Reagan displayed an almost complete indifference to the HIV epidemic, which at the time, was viewed as a disease that affected only gay people, something that would be proven wrong over time.
And it's in the setting that we find the “bones” of it all: the cannibals in “Bones and All” are, in their essence, people left behind at the edges of society, people who are defined by a lack of belonging (aka, the same people wronged by Reagan's administration) and that, because of these reasons, don't see another path for their lives, other than fully giving themselves in to their nature. With that in mind, it's amazing how Kajganich depicts, as the screenplay's main point of view, someone who is surrounded by uncertainties on who she is and who she can trust, developing the protagonist in such a perfect way it's almost cathartic, by the time the credits start rolling.
With that said, I believe that yes, “Bones and All” may have a wider visibility in the ongoing award season if compared to previous critically-acclaimed horror works, due to its fusion of genres, and mainly, due to the narrative's symbolic potential, which ends up connecting it with reality in a flawless way. If I had to call the shots, I'd easily place it as one of the nominees for Best Picture, Director and Adapted Screenplay at next year's Oscars. Films with a courageous approach like the one in “Bones and All” come around very rarely, especially one that can ignite a reflection on today's society based on the past. Unfortunately, I'm afraid the Oscars aren't ready yet to make such a bold move. Nevertheless, I'll keep on rooting for it, because, after all, hope is the last thing that ever dies... (LOL))
Eu só ouvi falar da atriz Taylor Russell, intérprete de Maren, a protagonista, quando fora anunciado que ela iria estrelar o filme ao lado do mais conhecido Timothée Chalamet. Não é o primeiro trabalho dela (o papel que deu mais destaque para a atriz antes de “Até os Ossos” foi no filme “As Ondas”, dirigido por Trey Edward Shults), mas o desempenho dela aqui como uma jovem canibal me impressionou a ponto de, a partir de agora, me comprometer a ver todo trabalho que ela fará a seguir. Como dito nos parágrafos anteriores, a personagem de Russell se encontra em constante dúvida sobre suas ações ao longo do filme, e estes dilemas podem ser vistos claramente na performance da atriz. Seja pela linguagem corporal ou pela maneira que ela usa seus diálogos, Russell se entrega completamente à personagem como se fosse a coisa mais natural do mundo. Mal posso esperar pelo próximo trabalho dela. Para complementar o desenvolvimento da protagonista, temos um papel puramente expositivo do André Holland, que ajuda tanto o espectador quanto a personagem a entender o que diabos está acontecendo, após um momento crucial de cair o queixo.
Enquanto a Maren de Russell é tomada pela dúvida, o Lee de Timothée Chalamet exala uma confiança impassível, como se ele fosse, nas próprias palavras do personagem, “um novo tipo de super-herói bizarro”. Mas, e isso é o mais interessante sobre a performance de Chalamet, ao mesmo tempo que ele parece ser a pessoa mais confiante e convencida do mundo, há todo um mistério em volta de seu personagem. A cena em particular que revela esse mistério é uma das melhores e (surpreendentemente) mais emocionantes do filme. A química entre Russell e Chalamet é um dos pontos mais fortes de “Até os Ossos”, sem sombra de dúvida. Os jovens atores conseguem, com enorme sucesso, cumprir algo crucial para que o filme funcione: fazer com que os espectadores se importem com o caminho que seus personagens irão percorrer ao longo da trama, mesmo com seus hábitos de alimentação nada convencionais.
Se tem uma categoria no Oscar ano que vem onde uma indicação para “Até os Ossos” é quase certeira, definitivamente é a de Melhor Ator Coadjuvante para o sempre maravilhoso Mark Rylance. O desempenho do ator vencedor do Oscar por “Ponte dos Espiões” é simplesmente arrebatador. Em toda cena em que ele aparece, há uma aura predominante de ameaça e perigo que rodeia seu personagem, sendo uma pessoa completamente imprevisível. Porém, o feito mais incrível que Rylance, Kajganich e Guadagnino conseguem concretizar é fazer com que o espectador sinta pena desse personagem, mesmo com todas as confirmações de que ele não é uma boa pessoa. E, mais uma vez fazendo uma ponta significativa em um filme de Luca Guadagnino, temos o Michael Stuhlbarg, cujo personagem tem um monólogo que consegue resumir o arco narrativo da protagonista em uma cena de altíssima importância.
(I only heard of actress Taylor Russell, who plays Maren, the protagonist, when it was announced that she would star in the film alongside the better known Timothée Chalamet. This isn't her first role (the role that gave her the most attention before “Bones and All” was in Trey Edward Shults's “Waves”), but her work here as a young cannibal impressed me in such a way that, starting now, I'm committing to watching every single thing she's doing next. As previously said, Russell's character finds herself in constant doubt over her actions throughout the film, and these dilemmas are clearly depicted in the actress's performance. Whether it's through her body language or the way she uses her dialogue, Russell gives every inch of herself to her character like it's the most natural thing in the world. I can't wait to see what she does next. In order to complement the protagonist's development, we have a purely expositional role by André Holland, who helps both the viewer and the character understand what the hell is going on, after a crucial jaw-dropping moment.
While Russell's Maren is flooded with doubt, Timothée Chalamet's Lee exhales a bulletproof amount of confidence, as if he was, in the character's own words, “some weird new kind of superhero”. But, and this is the most interesting thing about Chalamet's performance, at the same time he seems to be the most cocky, confident person in the world, there's a whole mystery surrounding his character. The scene in particular that brings that mystery into the light is one of the film's best and (surprisingly) most emotional sequences. The chemistry between Russell and Chalamet is one of the strongest parts of “Bones and All”, without a shadow of a doubt. The young actors manage to, successfully, fulfill a crucial role in order for the film to work: making the viewers care for the path their characters will take throughout the plot, even with their unconventional feeding habits.
If there's one category at next year's Oscars where a nomination for “Bones and All” is almost a certainty, it's definitely Best Supporting Actor for the always wonderful Mark Rylance. The work by the Oscar-winning actor for “Bridge of Spies” is simply astonishing. In every scene he's in, there's a predominant aura of threat and danger circling around his character, being a completely unpredictable person. However, the most incredible feat that Rylance, Kajganich and Guadagnino manage to conquer is getting the viewer to feel sorry for this character, despite all the red flags that indicate and confirm that he's not a good person. And, once again making a significant cameo in a Luca Guadagnino film, we have Michael Stuhlbarg, whose character has a monologue that sums up the protagonist's entire narrative arc into one highly important scene.)
E, por fim, nos aspectos técnicos, temos um retrato bastante natural, cru e realista de suas ambientações por meio do trabalho estupendo de direção de fotografia, direção de arte e trilha sonora. A direção de fotografia é assinada pelo georgiano Arseni Khachaturan, e em várias partes, o trabalho dele em “Até os Ossos” me lembrou bastante do que o Joshua James Richards fez nos filmes dirigidos pela Chloé Zhao, como “Songs My Brothers Taught Me” e “Nomadland”. Há muitas cenas que fazem uso de iluminação natural. Há sequências onde a câmera parece estar literalmente correndo atrás do personagem, injetando uma dose de adrenalina no que está sendo retratado. A câmera de Khachaturan trabalha em conjunto com a montagem do Marco Costa para fazer com que as cenas de canibalismo sejam realistas ao invés de sensacionalistas, deixando muitas coisas implícitas, o que é mil vezes mais eficaz do que ver uma infinidade de sangue e tripas só por ter mesmo. Eu não descartaria uma possível indicação ao Oscar de Melhor Direção de Fotografia.
A direção de arte faz um trabalho sensacional com os cenários nos quais os personagens se encontram. Ao invés de termos cenários esteticamente perfeitos reminiscentes ao American Way of Life, como por exemplo, os de “Não se Preocupe, Querida”, temos ambientações essencialmente precárias, o que, novamente, reforça o caráter metafórico da narrativa, de retratar os canibais como pessoas deixadas às margens da sociedade, que não têm condições financeiras para encontrar um lugar fixo e fincar suas raízes ali. É um visual drasticamente diferente dos outros filmes de Guadagnino, como “Me Chame pelo Seu Nome” e “Suspiria” (que retratam cenários de tirar o fôlego da Itália e da Alemanha, respectivamente), mas que é tão eficaz e imersivo quanto eles.
E, em terceiro lugar, temos o design de som e a trilha sonora. Há um foco notável nos pequenos sons de “Até os Ossos”, em especial o olfato e a mastigação. Tem uma explicação lógica no roteiro do porquê o primeiro tem tanto destaque; agora o foco na mastigação é algo verdadeiramente enervante, como se fosse um tipo doentio de ASMR. Especialmente nas cenas de canibalismo, o trabalho de design de som consegue fazer o espectador se sentir mal por dentro, e a parte mais interessante é que os atos canibais têm poucos segundos de tela antes da câmera cortar para uma perspectiva diferente. Mas o som perdura, estendendo o período de incômodo do espectador em relação à cena somente através da audição. Tá aí mais uma categoria que eu não descartaria no Oscar ano que vem (Melhor Som).
Por último, mas certamente não menos importante, temos a trilha sonora original do Trent Reznor e do Atticus Ross, duas vezes vencedores do Oscar de Melhor Trilha Sonora Original (por “A Rede Social” e “Soul”). Eu fiquei positivamente impressionado com o quão natural e acústico o trabalho da dupla foi em “Até os Ossos”, já que eles costumam experimentar (e muito) com sons eletrônicos e sintetizadores para adicionar um caráter etéreo e incomum à identidade sonora dos filmes. Aqui, o contrário acontece: é uma trilha sonora mais limpa, quase “caseira”, que acaba casando perfeitamente com a vibe de road movie que Kajganich coloca no roteiro. Me lembrou bastante do trabalho do Gustavo Santaolalla nos videogames de “The Last of Us”, assim como as canções originais de Sufjan Stevens compostas para “Me Chame pelo Seu Nome”. Além das faixas instrumentais de Reznor e Ross, as cenas de “Até os Ossos” também são embaladas por canções de bandas da época retratada, como Kiss, Men At Work, Duran Duran, Joy Division, New Order e a-ha.
(And finally, in the technical aspects, we have a really natural, raw and realistic portrait of its setting conveyed through the stupendous work in cinematography, production design and score. The cinematography is by the Georgian Arseni Khachaturan, and in several times, his work in “Bones and All” reminded me a lot of what Joshua James Richards did in Chloé Zhao-directed films, such as “Songs My Brothers Taught Me” and “Nomadland”. There are many scenes that use natural lighting. There are sequences where the camera seems to be literally running after the character, injecting a dosage of adrenaline on what's being portrayed. Khachaturan's camera works in tandem with Marco Costa's editing to make the cannibalistic scenes seem realistic rather than sensational, leaving lots of things implied, which is a thousand times more effective than just showing endless blood and guts for the sake of it. I wouldn't discard a possible nomination for Best Cinematography at next year's Oscars.
The production design does a sensational job with the scenarios the characters find themselves in. Rather than having aesthetically perfect sets reminiscent of the American Way of Life, like the ones in “Don't Worry Darling”, we have essentially precarious scenarios, which, once again, reinforces the narrative's metaphorical tone, of portraying cannibals as people left at the margins of society, who don't have financial conditions to find a fixed place and place their roots there. It's a visual that's drastically different than other Guadagnino films, like “Call Me By Your Name” and “Suspiria” (which portray breathtaking locations in Italy and Germany, respectively), but it's just as effective and as immersive as those films.
And, in third place, we have the sound design and the original score. There's a remarkable focus on the little sounds of “Bones and All”, especially when it comes to smelling and chewing. There's a logical explanation in the screenplay for the highlight on the former; but the focus on the chewing is something truly unnerving, like it's some twisted kind of ASMR. Specially during the cannibalistic scenes, the sound work manages to make the viewer feel uneasy, and the most interesting part is that the cannibal acts last for only seconds onscreen before the camera cuts away to a different perspective. But the sound lives on, extending the viewer's uneasiness towards the scene only through hearing. Now, there's another category I wouldn't easily discard at next year's Oscars (Best Sound).
At last, but definitely not least, we have the original score by Trent Reznor and Atticus Ross, two-time Oscar winners for Best Original Score (“The Social Network” and “Soul”). I was positively impressed with how natural and acoustic the duo's work in “Bones and All” was, as they usually experiment (a lot) with electro sounds and synthesizers to add a more ethereal and unusual tone to the film's sound identity. Here, it's the opposite: it's a much cleaner, almost “homemade” score, which ends up being a perfect match to the road movie vibe Kajganich emulates in the screenplay. It reminded me a lot of Gustavo Santaolalla's work in “The Last of Us” and “The Last of Us Part II”, as well as Sufjan Stevens's original songs for “Call Me By Your Name”. Besides Reznor and Ross' instrumental tracks, the scenes of “Bones and All” are also aided by songs from famous '80s bands, such as Kiss, Men at Work, Duran Duran, Joy Division, New Order and a-ha.)
Resumindo, à primeira vista, “Até os Ossos” pode ser um filme difícil de engolir (trocadilho não-intencional), mas a mistura entre o romance e o terror, a estrutura narrativa de road movie e o uso bem-calculado da violência fazem o novo filme de Luca Guadagnino ir além de sua premissa literal e investir em um retrato repleto de metáforas e simbolismos de sua problemática e conturbada ambientação, resultando em uma obra que, ao mesmo tempo, sensibiliza o espectador pelos seus personagens e o assusta pelo seu realismo. Somando isso ao desempenho excelente do elenco e ao trabalho estupendo dos aspectos técnicos, temos um dos melhores (e mais românticos) filmes do ano.
Nota: 10 de 10!!
É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,
João Pedro
(In a nutshell, at first sight, “Bones and All” might be a tough film to swallow (no pun intended), but the mixture between romance and horror, the narrative structure of a road movie and the well-calculated use of violence make Luca Guadagnino's new film rise above its literal premise and invest in a metaphor-filled portrayal of its problematic and controversial setting, resulting in a piece of work that, simultaneously, awakens the viewer's sensibility towards its characters and constantly scares them because of its realism. Put that together with the cast's excellent performances and the technical aspects' stupendous work, and you've got one of the year's best (and most romantic) films.
I give it a 10 out of 10!!
That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,
João Pedro)
Excelentes filme e resenha!!!
ResponderExcluirAgora fiquei curioso pra ver o filme
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