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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para trazer a resenha do mais recente lançamento no catálogo original da Netflix. Um estudo sobre as relações raciais nos EUA, o filme em questão é uma verdadeira celebração da cultura negra, e um tributo à uma estrela que parou de brilhar cedo demais. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “A Voz Suprema do Blues”. Vamos lá!
(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to bring the review of the most recent release in Netflix's original catalog. A study on racial relations in the United States, the film I'm about to analyze is a true celebration of Black culture, and a tribute to a star that stopped shining way too soon. So, without further ado, let's talk about “Ma Rainey's Black Bottom”. Let's go!)
Baseado na peça “Ma Rainey's Black Bottom”, escrita por August Wilson, o filme relata uma fatídica sessão de gravações entre Ma Rainey (Viola Davis), considerada a “Mãe do Blues”, e sua banda, cujo trompetista, Levee (Chadwick Boseman), possui inúmeras ambições para começar uma carreira solo, no ano de 1927 em Chicago. Envoltos pelas difíceis relações raciais da época, Ma Rainey e sua banda refletem sobre as condições nas quais os negros vivem, e a exploração sofrida por eles pelas mãos de produtores brancos. Tais reflexões acabam por despertar uma tensão, colocando o futuro da banda em risco.
(Based on the play of the same name, written by August Wilson, the film follows a fateful recording session between Ma Rainey (Viola Davis), who's considered the “Mother of Blues”, and her band, whose trumpeter, Levee (Chadwick Boseman), has numerous ambitions in starting a solo career, in the year of 1927 in Chicago. Surrounded by the tough racial relations of that time, Ma Rainey and her band reflect on the conditions that colored people find themselves in, and the exploitation they suffer from the hands of white producers. These discussions end up giving birth to some tension, putting the band's future in jeopardy.)
Antes de começar a falar do roteiro em si, acho melhor dedicar algumas linhas para falar da mente brilhante por trás da peça que serviu de base para “A Voz Suprema do Blues”: August Wilson. Chamado de “o poeta teatral da América negra”, Wilson ficou conhecido nos EUA por relatar, nos palcos, o estilo de vida da comunidade afro-americana no século XX. Ficou especialmente conhecido por uma série de dez peças conhecida como “O Ciclo de Pittsburgh”, a qual é composta por obras como “Fences” (vencedora do prêmio Pulitzer de Drama, que foi adaptada em um filme vencedor do Oscar dirigido por Denzel Washington, “Um Limite entre Nós”), “The Piano Lesson” (que também foi vencedora do Pulitzer), e “Ma Rainey's Black Bottom”, que acabou por servir de base para a obra em questão. Com isso dito, vamos falar sobre o roteiro. Escrito por Ruben Santiago-Hudson, dramaturgo conhecido por dirigir uma das peças mais famosas de Wilson, o roteiro de “A Voz Suprema do Blues” consegue fazer o mesmo que “Um Limite entre Nós” fez com sucesso em 2016, que é estabelecer uma trama extremamente contida. Enquanto o filme de Denzel Washington reduziu suas ações e cenas para uma casa, a obra em questão também tem sua ambientação reduzida, concentrando toda a ação dentro de um estúdio de gravações. Isso acaba por manter a veia teatral das peças que serviram de base para as adaptações cinematográficas e, por consequência, honrar o legado que August Wilson deixou para o mundo. Assim como vários filmes baseados em peças, “A Voz Suprema do Blues” é totalmente guiado pelo diálogo. Gosto muito de comparar filmes baseados em peças com “Deus da Carnificina”, baseado na obra de Yasmina Reza, onde uma discussão aparentemente amistosa leva à um completo caos em menos de duas horas, e a arma principal para o desenvolvimento da trama também é o diálogo. E uma das melhores coisas sobre o roteiro de Santiago-Hudson é o constante equilíbrio entre as cenas internas, as quais são repletas de diálogos entre os personagens, e as cenas externas, que não possuem nenhuma fala, mas contêm o mesmo poder simbólico que algum diálogo teria. Isso se mostra de forma evidente na cena inicial do filme, que retrata um show da protagonista com sua banda. E daquele momento, já é possível ver as discordâncias entre Ma Rainey e seu trompetista, Levee, as quais serão predominantes pelo sucinto tempo de duração de 1 hora e 34 minutos do longa. Outro ótimo exemplo seria uma cena em que alguns membros da banda de Rainey vão à um mercado, onde atraem o olhar imediato de todas as pessoas presentes, todas brancas. O olhar direcionado aos personagens negros fala no mesmo volume que algum diálogo falaria. São cenas pequenas, mas tão eficientes quanto as sequências internas. É também preciso ressaltar a qualidade dos diálogos criados por Wilson. As afirmações e histórias que os personagens contam são impactantes, e elas possuem a capacidade de fazer o espectador visualizar os acontecimentos narrados sem realmente mostrá-los em tela, e alguns desses relatos são de cortar o coração, de tão verdadeiros que são. Através dessas histórias, é possível ver a raiva e o desgosto crescendo nos rostos dos personagens, e essas pequenas reações conseguem retratar a injustiça social tão bem quanto as cenas de violência policial no excelente “Os 7 de Chicago” (cuja resenha você pode ler aqui: http://nocinemacomjoaopedro.blogspot.com/2020/10/os-7-de-chicago-usando-o-passado-para.html). E por fim, temos as cenas musicais do longa, as quais são um verdadeiro deleite de se ver. Durante essas sequências, é possível sentir a liberdade que os músicos de blues sentem ao fazer o que eles fazem de melhor, ao se expressarem e contarem suas histórias através da música. São cenas que realmente celebram as contribuições da cultura negra à presente diversidade cultural nos EUA. Resumindo, o roteiro de “A Voz Suprema do Blues” aproveita sua ambientação limitada ao máximo, fazendo uso de diálogos impactantes e cenas não-verbais para retratar as relações sociais da época.
(Before I start talking about the film itself, I'd like to dedicate some lines to talk about the brilliant mind behind the play which “Ma Rainey's Black Bottom” was based on: August Wilson. Regarded as “the theater poet of Black America”, Wilson gained fame in the US by portraying, on stage, the African-American community lifestyle in the 20th century. He was best-known for a series of ten plays known as “The Pittsburgh Cycle”, which is composed by works such as “Fences” (a Pulitzer Prize-winning drama play, which was adapted in an Oscar-winning eponymous film directed by Denzel Washington), “The Piano Lesson” (which also was a Pulitzer Prize winner), and “Ma Rainey's Black Bottom”, which ended up being the inspiration behind the film being analyzed in this review. With that out of our way, let's talk about the screenplay. Written by Ruben Santiago-Hudson, a playwright known for directing one of Wilson's most famous plays, the script for “Ma Rainey's Black Bottom” does exactly what “Fences” successfully did in 2016, which is establishing an extremely contained story. While Denzel Washington's film reduced its actions and scenes to one single house, this film also reduces its setting, focusing all the action inside a recording studio. This ends up keeping the theatrical vein of the work that was adapted into film, and consequently, that decision honors the legacy that August Wilson left to the world. As in many films based on theatre plays, “Ma Rainey's Black Bottom” is fully guided by dialogue. I really enjoy comparing play-based films with “Carnage”, based on Yasmina Reza's work, titled “God of Carnage”, where an apparently friendly conversation turns into real chaos in less than 2 hours, and the main weapon for the story to develop is also its dialogue. And one of the best things about Santiago-Hudson's screenplay is that it constantly balances its interior scenes, which are filled with dialogue, and the exterior ones, which don't have any of it, and still manage to contain the same symbolic power that lines would have had. This is shown evidently in the film's opening scene, which portrays a concert from the main character and her band. And from that moment, it's already possible to see the disagreements between Ma Rainey and her trumpeter, Levee, which will be predominant throughout the film's succint running time of 1 hour and 34 minutes. Another great example would be a scene in which some members of Rainey's band go to a nearby supermarket, where they attract the immediate glance of everyone in there, all of them being white people. The glance directed towards the black characters speaks at the same volume that a string of dialogue would. They are small scenes, but they're just as effective as the interior sequences. The quality of Wilson's dialogue also must be reinforced. The statements and stories that the characters tell are impactful, and they have the capacity of making the viewer visualize what's being narrated without actually showing it onscreen, and some of these stories are really heartbreaking, because of the truth behind them. Through these stories, we are able to see the anger and distaste growing on the characters' faces, and these little reactions manage to portray social injustice as well as the police brutality scenes in the excellent “The Trial of the Chicago 7” (you can read my review on it here: http://nocinemacomjoaopedro.blogspot.com/2020/10/os-7-de-chicago-usando-o-passado-para.html). And at last, we have the musical scenes, which are a real delight to behold. During these sequences, it's possible to see the freedom that blues musicians feel when doing what they do best, when they are expressing themselves and telling their stories through music. These are scenes that truly celebrate the contributions of Black culture to the current cultural diversity in the US. To sum it up, the screenplay for “Ma Rainey's Black Bottom” makes the most of its limited setting, making use of impactful dialogue and non-verbal scenes to portray the social relations of the time it's set in.)
Um dos aspectos que realmente impulsionou a divulgação de “A Voz Suprema do Blues” para o público geral foi a inesperada morte de Chadwick Boseman, que faleceu durante o processo de pós-produção, fazendo dessa a sua última performance em um filme. E Boseman realmente entrega uma tremenda performance aqui. Mas antes, vamos falar da Viola Davis. É o segundo papel que ela interpreta em um filme baseado em uma peça de August Wilson, desde sua atuação vencedora do Oscar em “Um Limite entre Nós”. E mesmo tendo muito pouco tempo em tela, se comparado com os outros personagens, a presença de Davis é sentida em cada minuto do filme, até quando ela mesma não está presente na cena. Há uma cena onde ela reflete sobre a exploração de artistas negros por produtores brancos que é assustadoramente verdadeira, e provavelmente será a responsável por indicá-la ao Oscar. A última performance do Chadwick Boseman é definitivamente a melhor dele, para mim. Com o filme sendo filmado em 2019, época em que Boseman já estava sob tratamento de quimioterapia por causa do câncer de cólon que lentamente o enfraquecia, o ator demonstra uma grande quantidade de carisma, energia, e personalidade aqui. Há dois monólogos em particular que poderão firmemente servir de base para uma indicação (e talvez, vitória) póstuma ao Oscar. A raiva que ele extravasa, o ódio que ele tem dentro de si. O personagem dele definitivamente foi o que mais sofreu com a injustiça social no filme. Como os outros membros da banda, temos performances competentes de Colman Domingo, Glynn Turman e Michael Potts, cujos personagens trocam diálogos impactantes com o personagem de Boseman. Em papéis mais coadjuvantes, temos a Taylour Paige, que serve como mais uma razão para as discordâncias entre os personagens de Davis e Boseman, e Dusan Brown, que rende um necessário alívio cômico à trama. E por fim, temos o Jeremy Shamos, interpretando o gerente de Rainey, e o Jonny Coyne, interpretando o dono do estúdio em que o filme é ambientado. Todos os atores conseguem lidar com os diálogos criados por August Wilson com muita naturalidade, o que é muito bom.
(One of the aspects that really propelled the promotion of “Ma Rainey's Black Bottom” for the general audience was the unexpected death of Chadwick Boseman, who passed away during the post-production process, making this his final performance in a film. And Boseman really delivers a knockout performance here. But before, let's talk about Viola Davis. This is her second role in a film based on an August Wilson play, after her Oscar-winning turn in “Fences”. And even though she has very little screen time, if compared to other characters, Davis's presence is felt in every minute in the film, even when she's not onscreen. There's a scene where she reflects on the exploitation of Black artists by white produces that is hauntingly true, and most likely will be responsible for an Oscar nomination. Chadwick Boseman's final performance is definitely his best, in my opinion. With the movie's filming taking place in 2019, a time where he was already under chemotherapy treatment over the colon cancer that slowly weakened him, the actor shows an enormous quantity of charisma, energy and personality here. There are two particular monologues that can firmly serve as base for a posthumous nomination (and maybe, win) to an Oscar. The anger he lets out, the hatred he has inside himself. He definitely portrays the character that suffered the greatest amount of social injustice in the film. As the other band members, we have competent performances by Colman Domingo, Glynn Turman and Michael Potts, whose characters share some impactful dialogue with Boseman's character. In more supporting roles, we have Taylour Paige, who portrays another reason for the characters of Davis and Boseman to disagree on, and Dusan Brown, who provides a necessary comic relief. And at last, we have Jeremy Shamos, playing Rainey's manager, and Jonny Coyne, playing the owner of the recording studio the film's set in. All the actors manage to deal with August Wilson's dialogue in an extremely natural way, which is really good.)
Assim como várias obras de época, “A Voz Suprema do Blues” tem aspectos técnicos impecáveis. Como o filme só possui uma ambientação, isso permite que a câmera do Tobias A. Schliessler viaje de forma mais fluida entre os vários cômodos do estúdio, ao invés de abruptamente cortar para outra cena. São movimentos muito mais orgânicos, o que é muito bom. A montagem do Andrew Mondshein é bem eficiente. Inclusive, em uma cena em particular, a edição é crucial para que a sequência cumpra seu propósito na trama. A direção de arte fez um trabalho fenomenal de recriação da época retratada, especialmente nos departamentos de design de produção, figurino, e maquiagem. É exatamente o que um espectador iria esperar de um filme ambientado na década de 1920. A trilha sonora do Branford Marsalis faz muito bem em fazer uso de instrumentos típicos da época retratada para compor a sonoridade do filme. Ao contrário do que aconteceu com a brilhante trilha sonora de “Mank”, a trilha de Marsalis dá uma remasterização revigorante às canções de Rainey, ao mesmo tempo que cria faixas instrumentais igualmente impactantes.
(As it happens with many period films, “Ma Rainey's Black Bottom” has flawless technical aspects. As the film has only one setting, it allows Tobias A. Schliessler's camera to travel more fluidly between the studio's many rooms, rather than just abruptly cut to other scene. They are much more organic movements, which is really good. Andrew Mondshein's editing is quite efficient. By the way, in one particular scene, the editing is vital for the sequence to fulfill its purpose in the plot. The art direction does a phenomenal job in recreating the time it is set in, especially in the set design, costume design, and makeup departments. It's exactly what a general viewer would expect of a film set in the 1920s. Branford Marsalis's score succeeds in using typical instruments from the time portrayed to compose the film's sonority. On the contrary of what happened to the brilliant score of “Mank”, Marsalis's score gives an invigorating remaster to Rainey's traditional songs, at the same time it creates equally impactful instrumental tracks.)
Resumindo, “A Voz Suprema do Blues” fecha um excelente ano para filmes originais da Netflix com chave de ouro. Contando com um roteiro conciso, diálogos impactantes, atuações naturais e competentes, e aspectos técnicos que conseguem recriar a época retratada com sucesso, o filme de George C. Wolfe é uma verdadeira celebração à cultura negra e um tocante tributo à uma estrela que parou de brilhar cedo demais.
Nota: 9,5 de 10!!
É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,
João Pedro
(In a nutshell, “Ma Rainey's Black Bottom” caps off an excellent year for Netflix original films with a bang. Relying on a succint screenplay, impactful dialogue, natural and competent performances, and technical aspects that successfully recreate its setting, George C. Wolfe's film is a true celebration of Black culture and a touching tribute to a star that stopped shining too soon.
I give it a 9,5 out of 10!!
That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,
João Pedro)
Gosto da atuação do trompetista!!!!
ResponderExcluirBacana!!!
ResponderExcluirParabéns JP
ResponderExcluirUai, comentei agora, as 14:40hrs e saiu como 09:40 😬
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