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quarta-feira, 22 de julho de 2020

Animações Diferentes - "Perfect Blue": um thriller psicológico cuidadosamente construído (Bilíngue)

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E aí, meus caros cinéfilos! Tudo bem com vocês? Estou de volta, para trazer a segunda parte da nossa postagem especial sobre animações diferentes. O filme em questão pode até ser a animação mais perturbadora que eu já vi na minha vida, sendo um thriller psicológico cuidadosamente construído para colocar o espectador no corpo da protagonista, frequentemente nos fazendo questionar se o que estamos vendo é verdadeiro ou não. Então, sem mais delongas, vamos falar sobre “Perfect Blue”. Vamos lá!

(What's up, my dear film buffs! How are you guys doing? I'm back, in order to bring the second part of our special post on different animated films. The film I'm about to review might as well be the most disturbing animated film I've ever seen, a psychological thriller carefully crafted to put the viewer in the protagonist's shoes, frequently making us question whether we're watching something real or not. So, without further ado, let's talk about “Perfect Blue”. Let's go!)



O filme acompanha Mima Kirigoe (voz original de Junko Iwao), uma jovem cantora, membro de um grupo musical moderadamente famoso no Japão, que decide desistir do seu lugar na banda para investir em trabalhos como atriz. A partir dessa escolha, ela tem a impressão de estar sendo perseguida por um fã e um fantasma de seu passado, enquanto assassinatos brutais começam a ocorrer, o que faz com que Mima questione sua própria sanidade.

(The film follows Mima Kirigoe (originally voiced by Junko Iwao), a young singer, part of a moderately famous musical group in Japan, who decides to give up her spot on the band to invest in acting jobs. From that choice, she starts to have the impression of being stalked by a fan and a ghost of her past, while gruesome murders begin to occur, which makes Mima question her own sanity.)



Eu, honestamente, não sabia muito o que esperar desse filme. As críticas em si ficaram bem divididas, e o que realmente me deixou curioso para assisti-lo foi a imagem da protagonista espalhando o sangue no próprio rosto. Essa imagem ficou grudada na minha cabeça. Eu achei ela ao mesmo tempo aterrorizante e bela. Poética, até. Mas eu não esperava que o filme tivesse ido no rumo que realmente foi. É o primeiro filme dirigido pelo Satoshi Kon, que ficou conhecido por tornar a linha entre realidade e fantasia no Japão contemporâneo cada vez mais tênue, tendo entre seus trabalhos mais conhecidos este filme e “Paprika”; obras que, respectivamente, fãs alegam ter sido a inspiração para dois filmes de 2010: “Cisne Negro”, de Darren Aronofsky; e “A Origem”, de Christopher Nolan. Diga-se de passagem que “Perfect Blue” definitivamente NÃO é para crianças. Como dito na introdução, o filme é um thriller psicológico, ou seja, faz uso de um roteiro tenso, contendo uma carga psicológica bem pesada, e, como a cereja no topo desse bolo, envolto em imagens violentas e perturbadoras. E Kon faz um ótimo trabalho em explorar a sanidade de sua protagonista, de modo que o espectador começa a se sentir como ela: confusa, duvidosa, frequentemente questionando se o que ela viu (e, consequentemente, o que nós vimos) é real ou não. Uma coisa que vale a pena ser mencionada é que “Perfect Blue” é um filme ambientado em sua época de lançamento (a segunda metade dos anos 1990): o fenômeno da Internet estava apenas começando, e a TV estava se tornando cada vez mais popular. O que me deixou realmente impressionado foi como o diretor conseguiu estabelecer uma atmosfera tão sinistra em menos de 1 hora e 30 minutos de duração. Os primeiros minutos fazem um uso extremamente eficiente de flashbacks e flashforwards para explorar as diferenças entre as duas “vidas” da protagonista: enquanto ela é vista dando um baita show para seus fãs; do nada, há uma quebra de expectativa, cortando para uma cena dela fazendo algo completamente trivial, como comprar comida para seus peixes de estimação. Essas quebras funcionam perfeitamente para fazer com que o espectador aprenda sobre o passado da personagem principal, e para que ele se adapte com essa nova persona dela. Quando ela inicia seus trabalhos como atriz, é aí que os eventos perturbadores mencionados na sinopse começam a acontecer. E, a partir desse momento, somos mergulhados no próprio corpo da protagonista, de modo que nós vemos o que ela vê. Algo que muitas pessoas podem achar frustrante, mas eu, pelo contrário, acho brilhante, é como o diretor faz uso de uma montagem cuidadosamente calculada para fazer o espectador realmente acreditar que os eventos vistos na tela são reais. Aí a câmera começa a afastar, e percebemos que não passava de uma cena para o programa de TV no qual a protagonista participa. Mais um uso genial que o diretor faz da quebra de expectativa, completamente manipulando a percepção do espectador em diferenciar ficção da realidade, o que acaba por causar perturbação e intriga nele, mesmo através de algo que não é “real”. Se o que acabei de escrever faz parecer que o terror psicológico presente no filme é algo gratuito e, às vezes, frustrante; é essencial mencionar que além de possuir um roteiro extremamente engajante, a obra de Kon também aborda temas interessantes, relevantes na atualidade e dignos de discussão, tais como: a mudança de rumo na carreira de um “ídolo”, e como os fãs lidam com essa mudança; o quão longe esses “ídolos” vão para receber a atenção desejada e a consequente obsessão que alguns fãs podem ter por essas pessoas, o que pode acabar tornando a saúde mental de ambas as partes cada vez mais deterioradas. É algo muito perturbador, mas, por consequência, muito eficiente. O ato final da obra é repleta de ação, o que certamente irá compensar para aqueles espectadores que podem ficar potencialmente entediados com o terror psicológico predominante nos dois primeiros atos. E a última cena é, na minha opinião, perfeita. Não posso dizer que entendi tudo de primeira ao assistir o filme, mas depois de dar uma digerida na minha cabeça, posso tranquilamente dizer que é uma das melhores animações adultas que eu já vi na minha vida. E deve ficar ainda melhor depois de vê-la novamente.

(I, honestly, didn't know what to expect from this film. The reviews themselves were divided over it, and what really got me curious into watching it was an image of the protagonist spreading blood over her own face. That image got stuck in my head. I thought it was at the same time terrifying and beautiful. Heck, poetic, even. But I totally didn't expect it to go the way it actually went. This is the first film directed by Satoshi Kon, who was known for blurring the lines between fantasy and reality in contemporary Japan, with his most known works being this film and “Paprika”; these films, in turn, are alleged by fans to have been the inspiration to two 2010 Oscar-nominated movies: Darren Aronofsky's “Black Swan”, and Christopher Nolan's “Inception”, respectively. I have to say that “Perfect Blue” is definitely NOT for children. As said in the introduction, this film is a psychological thriller, which means that it makes use of a tense script, containing a pretty heavy psychological weight, and that, as the cherry on top of it, is surrounded by violent and disturbing imagery. And Kon does a superb job in exploring its protagonist's sanity, in a way that the viewer starts feeling the same way she does: confused, doubtful, frequently asking if what she saw (and, consequently, what we watched) was real or not. One thing worth mentioning is that “Perfect Blue” is set in its release time (the late 1990s): the Internet phenomenon was just beginning, and TV was becoming more and more popular. What left me really impressed was how the director managed to create such a sinister atmosphere in less than 1 hour and 30 minutes of running time. Its first minutes make a great use of flashbacks and flashforwards to explore the differences between the protagonist's two “lives”: while she's seen putting on one hell of a show for her fans; out of nowhere, there's a shattering of expectations, cutting to a scene where she's doing something completely normal, like buying food for her pet fish. These cuts work perfectly to make the viewer learn about her past; and adapt to her new persona. When she begins her work as an actress, that's when the disturbing events mentioned in the synopsis start to happen. And, from that point, we see through the protagonist's eyes; we see what she sees. Something that many people might find frustrating, but I, on the contrary, thought it was brilliant, is how the director uses careful editing to make the viewer believe that what's happening on-screen is real. And then, the camera starts to back away, revealing that it was just a scene from the TV show that the protagonist stars in. Another genius use of the expectation break, completely manipulating the viewer's perception of telling the difference between fiction and reality, which ends up causing disturbance and intrigue, even through something that isn't “real”. If what I just wrote made it look like its psychological horror is gratuitous and, sometimes, frustrating; it's important to mention that besides having an engaging script, Kon's film deals with some interesting, relevant, and discussion-worthy themes, such as: the change of paths in the career of an “idol”, and how fans deal with that change; how far these “idols” will go to get the attention they want and, consequently, the obsession some fans might have over these people, which may end up making both parts' more and more mentally deteriorated. It's something really disturbing, yet as a result, very effective. The final act is action-packed, which will certainly compensate for those viewers who may find the psychological horror that dominates its first two acts rather boring. And the last scene is, in my opinion, perfect. I can't say I understood everything when the credits began to roll but, after digesting it for a bit in my head, I can safely say that it's one of the best adult animated films I've ever seen. And it may be even better when rewatched.)



Os personagens são desenvolvidos de forma quase impecável, especialmente quando se fala da protagonista, a Mima. Ao mudar de carreira, o espectador se sente imerso na cabeça dela: vendo o que ela vê, sentindo o que ela sente, se confundindo quando ela se sente confusa. Essa imersão acaba por tornar Mima em um dos melhores recursos em filmes com um viés psicológico: uma narradora não-confiável, porque nós não aprendemos a confiar totalmente no ponto de vista dela, já que ela consegue ver coisas que ninguém mais vê (algo bem parecido com o que aconteceu com a protagonista da série “Undone”, da Amazon Prime Video). Nós acompanhamos essa gradual deterioração da sanidade dela detalhadamente, resultando em uma abordagem engajante e perturbadora desse estilo de narrativa. Assim como todo protagonista problemático, Mima encontra suas âncoras na realidade através de seus agentes (que são desenvolvidos perfeitamente); um suposto fã que parece seguir cada um de seus passos (cujos pensamentos são expressos de forma esplêndida por meio de um blog) e seus colegas de trabalho (que se esforçam para fincá-la à realidade deles).

(The characters are developed in an almost flawless way, especially when it comes to its protagonist, Mima. As she changed her career: the viewer feels immersed in her head: seeing what she sees, feeling what she feels, confusing themselves when she feels confused. This immersion ends up turning Mima in one of the best resources in films with a psychological twist: an unreliable narrator, as we don't learn to fully trust her point of view, because she sees things that literally no one else sees (something much alike what happened with the main character from the show “Undone”, an Amazon Prime Video Original). We follow this gradual deterioration of her sanity in great detail, resulting in an engaging and disturbing approach to this style of narrative. Just like every troubled protagonist, Mima finds her anchors to reality through her agents (who are perfectly developed); an alleged fan who seems to follow every one of her steps (whose thoughts are splendidly expressed through a blog) and her co-workers (who make an effort to keep her fixed in their reality).)



Em termos técnicos, “Perfect Blue” não é datado, de maneira alguma, mas não chega à atemporalidade alcançada pelas primeiras obras do Studio Ghibli, por exemplo. Satoshi Kon faz um ótimo uso da animação tradicional para fazer vários contrastes entre as duas “personas” da protagonista: enquanto as cenas com a Mima cantora são vibrantes e envoltas com tons avermelhados; as cenas com a Mima atriz têm um tom mais azulado, mais sombrio, o que funciona perfeitamente, já que as cores vermelho e azul são opostas no círculo cromático. O uso de cor na direção de arte é tão essencial à trama, que o próprio título do filme pode ter um significado simbólico. A montagem é um dos principais meios de construção de atmosfera usados pelo diretor, que acha o ponto focal certo para tornar algumas cenas mais perturbadoras. Há alguns cortes bem rápidos em uma cena em especial, o que eu achei simplesmente sensacional, adicionando muito mais tensão à uma cena que, em sua essência, já era tensa. A trilha sonora do Masahiro Ikumi é outra obra-prima à parte, fazendo uso de simbolismos nas músicas chiclete do grupo musical da protagonista, e um crescendo gradual na trilha instrumental para transformar a atmosfera de certas cenas em algo muito mais inquietante e sufocante, até.

(Technically, “Perfect Blue” is not outdated, not at all, but it's not as timeless as Studio Ghibli's early work, for exemple. Satoshi Kon makes a great use of traditional animation to make several contrasts between the main character's two “personas”: while the scenes with singer Mima are vibrant and surrounded with red tones; the scenes with actress Mima have a more blue-ish, darker tone, which works perfectly, as blue and red are opposite colors in the chromatic circle. The use of color in the art direction is so essential to the plot, that its own title can have a symbolic significance. The editing is one of the main means the director uses to build the atmosphere, finding the right focus to make some scenes more disturbing. There are some very quick cuts in one particular scene, which I thought it was spectacular, adding much more tension to a scene that, in its essence, was already tense. Masahiro Ikumi's score is another particular masterpiece, making use of symbolisms in the bubblegum catchy songs by the protagonist's musical group, and a gradual crescendo in the instrumental score to transform the atmosphere of some scenes into something way more unsettling and suffocating, even.)



Resumindo, “Perfect Blue” não é só uma das melhores animações adultas que eu já vi, mas também um dos melhores suspenses psicológicos de todos os tempos. O diretor Satoshi Kon usa todos os meios possíveis para inserir o espectador com sucesso no corpo da protagonista, contando com um roteiro tenso e aspectos técnicos atmosféricos para fazer uma abordagem perturbadora e relevante a esse tipo de narrativa.

Nota: 9,5 de 10!!

É isso, pessoal! Espero que tenham gostado! Até a próxima,

João Pedro

(In a nutshell, “Perfect Blue” is not just one of the best adult animated films I've ever seen, but also one of the best psychological thrillers of all time. Director Satoshi Kon uses every mean he can to insert the viewer successfully into the protagonist's shoes, relying on a tense script and atmospheric technical aspects to make a disturbing and relevant approach to this type of narrative.

I give it a 9,5 out of 10!!

That's it, guys! I hope you liked it! See you next time,

João Pedro)



(P.S.: O filme está disponível no YouTube legendado tanto no áudio original quanto dublado em inglês. Deixarei os links respectivos aqui embaixo para vocês darem uma olhada!)

(P.S.: The film is entirely available on YouTube, with an English dub. I'll leave the link down below (the second one) for you to check it out!)





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